05/03/2008

Arte que se ouve: Cavaleiro Monge - Mariza / Fernando Pessoa


Para além das músicas que podem ouvir no blog, era também indispensável criar uma rubrica sobre música. Seguindo o espírito do que ando a fazer neste espaço, intitula-se "arte que se ouve". Já devem ter reparado que, em todas as rubricas que aqui tenho iniciado, tenho tido a preocupação de, pelo menos, as iniciar com algo made in Portugal, talvez com excepção dos posts sobre a História da Arte. É claro que tenciono, em todas elas, deixar-me levar até aos quatro cantos do mundo, mas achei importante que num blog escrito em português, ainda por cima sobre artes, dar a primazia a nomes maiores do meu país.

Outra das linhas com que me escrevo, é que por ser um blog, o que à partida é extremamente mais intimista que qualquer outro tipo de expressão cibernauta, a escolha do que coloco depende inteiramente do que me passa pela mente, dos meus gostos.


Falando sobre música portuguesa, era inevitável não começar com fado. O fado está-nos nos genes, quer se ouça muito ou pouco, quer se aprecie mais ou menos, existe nesta expressão um arquétipo geneticamente português. Falar de fado não é simples, porque o fado é tudo menos simples. Nele une-se uma grande voz, uma emotividade e expressão que vem da alma, a guitarra portuguesa única no mundo, muitas vezes a palavra saudade que é igualmente particular à Lingua Portuguesa. Marca-se pela forma como se canta, mas também pelo que se canta. Cantam-se os poemas de grandes expoentes da literatura. Não será exagero dizer que o fado é a união de três almas - a do poeta, a do trovador e por fim, a de quem ouve.


Poderia ter escolhido outro fado e outra ou outro fadista para iniciar esta rubrica, pois existem tantos, tantos. Mas, a mim, encanta-me a voz de Mariza, que fez com que o mundo acolhesse com grande ânimo o fado como expressão vencedora de world music, música do mundo. Igualmente, não posso esconder o meu fascínio por Fernando Pessoa. É de sua autoria o poema de "Cavaleiro Monge", explosão da vertente mística do espírito de Portugal que percorre o interior do poeta na figura de um cavaleiro monge - um templário. Agrada-me igualmente o vídeo clip, pois decorre na Quinta da Regaleira, cenário mais que adequado ao tema.


Prometo num futuro próximo falar da história do fado e, continuar a falar de música, de todos os géneros, de todas as nações.




Do vale à montanha

"Do vale à montanha,

Da montanha ao monte,

Cavalo de sombra,

Cavaleiro monge,

Por casas, por prados.

Por quinta e por fonte,

Caminhais aliados.


Do vale à montanha,

Da montanha ao monte,

Cavalo de sombra,

Cavaleiro monge,

Por penhascos pretos,

Atrás e defronte,

Caminhais secretos.


Do vale à montanha,

Da montanha ao monte,

Cavalo de sombra,

Cavaleiro monge,

Por plainos desertos

Sem ter horizontes,

Caminhais libertos.


Do vale à montanha,

Da montanha ao monte,

Cavalo de sombra,

Cavaleiro monge,

Por ínvios caminhos,

Por rios sem ponte,

Caminhais sozinhos.


Do vale à montanha,

Da montanha ao monte,

Cavalo de sombra,

Cavaleiro monge,

Por quanto é sem fim,

Sem ninguém que o conte,

Caminhais em mim."


Fernando Pessoa

24/10/1932




Veja aqui





Site de Mariza: www.mariza.com
Imagem de Mariza

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