13/08/2010

Crónicas da Carica: Insuficiência Renal Felina

( Eros, Ulisses e Zeus)


Até este momento, tenho andado a adiar escrever sobre este tema - a insuficiência renal nos gatos. A adiar porque, mentalmente, ainda estou a tentar digerir esta coisa maldita que, não me deixou melhor alternativa que eutanasiar o meu gato Eros. A adiar, para ganhar tempo e alguma distância, porque não quero ficar linhas e linhas a divagar sobre a infinita dimensão do amor de um humano pelo seu gato, e desse gato pelo seu humano. Não que as histórias de amor, mesmo com um final triste, não tenham mérito, mas o objectivo desta partilha é outro.
Assim como eu, após receber o diagnóstico do Eros, corri para o computador à procura de informação, de pessoas com experiências semelhantes, também entendo que tenho o dever de continuar esta corrente.

Trata-se de uma doença que, não tendo cura, a esperança de um gato conviver com a mesma mantendo alguma qualidade de vida reside, acima de tudo, no facto de esta ser detectada o mais rapidamente possível. A quem me lê, o meu apelo é que não esperem que o gato mostre sintomas. Porque quando assim é, muito provavelmente será tarde demais. Por mais que eles protestem, e não gostem de ir ao veterinário, a melhor prevenção será sempre fazer um check-up anual, fazer uma colheita de sangue para ver como estão os valores de ureia, creatinina e fósforo. Acreditem que é a única forma.

Os gatos nunca se queixam. São maravilhosos a esse ponto. O próprio organismo tenta compensar qualquer deficiência. Quando por fim o animal se começa a mostrar apático, com perda de apetite e de peso, a beber demasiada água, o mais provável é que 75% dos rins já não funcionem.

O nosso Eros, durante os cerca de 6 anos que esteve connosco, foi sempre um gato bastante activo, mimalho, muito falador e brincalhão. Nunca nos deu motivos, também por alguma ignorância nossa, para desconfiar que padecia desta doença. Nunca associámos o seu gosto por beber água, que sempre teve, a nenhuma doença. Também porque nunca o vimos sem falta de apetite, ou a vomitar muito, ou sem ir ao caixote, ou qualquer outra coisa que nos alertasse.
Depois da tosquia deu para perceber que estava mais magro. Começou a ter alguma perda de apetite. De início nada de alarmante, até porque com as ondas de calor que já vivemos este Verão não seria de esperar outra coisa.

Subitamente, a perda de apetite tornou-se preocupante. Só queria água. Perseguia-nos até à cozinha. Miava quando abriamos a torneira ou o frigorifico. Sempre, sempre a pedir mais água. Comecei a dar-lhe os patés favoritos todos os dias. De cada vez que abria uma nova lata conseguia algumas lambidelas, mas nada de entusiasmante. Lá trincava dois ou três croquetes. Uma pálida visão do gato que corria de cada vez que ouvia abanar o saco da ração e, que comia como um alarve.

Fui aconselhar-me junto da veterinária. Sabendo o quão traumática é para eles cada ida ao veterinário, a luta para os enfiar na transportadora, o stress porque passam, fui sozinha. Voltei com uma bisnaga de Felovite II - uma pasta que é um suplemento vitamínico e mineral e que, deveria abrir-lhe o apetite e, com a advertência de o levar a uma consulta caso ele não voltasse ao normal num prazo de dois dias.
Obviamente não funcionou.
Passados os dois dias, ele estava mais apático: o gato que corria sempre para cima de mim mal me deitava no sofá e "amassava o pão" na minha barriga, preferia ficar deitado numa poltrona.

A 4 de Agosto lá fomos nós até à Clínica Veterinária. Embora ele resmungasse, consegui enfiá-lo na transportadora à primeira. Não era um bom sinal. Aquele gato costumava ter uma força muscular brutal que nos impedia de o forçar a qualquer coisa.
Já no consultório o primeiro exame foi a pesagem. Embora não fosse pesado há bastante tempo, a diferença era assustadora. O Eros já não pesava cerca de 5 quilos, mas sim 3,750.
As análises sanguíneas confirmaram o pior - insuficiência renal crónica.
A creatinina, (que é uma molécula química derivada do metabolismo muscular e eliminada exclusivamente pelos rins, daí valores elevados serem indicadores de insufiência renal), cujo normal seria encontrar-se entre 0.8 e 2.4 estava a 10.6 mg/dL.
A ureia, (outro indicador importante, porque é filtrada pelos rins), deveria situar-se entre os 16 e os 36, e estava de tal forma elevada que a máquina não conseguiu ler o valor exacto, apenas dar o indicador de que era superior 130 mg/dL.
O último indicador - o fósforo - deveria encontrar-se entre 3.1 e 7.5 e estava a 16.1 mg/dL.

Valores assim tão elevados indicavam não só insuficiência renal, mas sim um estado crónico da doença, ou seja, algo que deriva de uma situação já prolongada. Seria aguda, se tivessemos tido a sorte de despistar a doença no início.
Naquele mesmo minuto ficou decidido que o Eros ficaria internado, a soro, na esperança de se conseguir valores mais normais nas futuras análises. Igualmente, seria feita uma ecografia, que permitiria ver o estado dos rins. Nesta altura, a maior esperança residia no facto de que um rim estivesse suficientemente saudável para em conjunto com alimentação específica, (as rações renais), injecções subcutâneas frequentes de soro e mais alguns remédios lhe dessem mais uns anos de vida com qualidade.

Aproveitei para fazer à nossa veterinária todas as perguntas que me ocorreram. Perguntei-lhe o que fiz de errado, como poderia ter sido melhor guardiã e ter evitado este diagnóstico. Pelos vistos, a insuficiência renal atinge cerca de 80% dos gatos. Não se sabe exactamente porquê. A genética tem influência, é mais comum em gatos a partir dos nove anos de idade, mas pouco mais se sabe. No entanto, por ser tão comum, sabem com o que podem contar, quais são os casos que inspiram alguma esperança e os que não.
Mas nunca se desiste enquanto há o vislumbre de uma luz no fundo do túnel. Então lá ficou o Eros na enfermaria.

Nunca perdeu os traços da sua personalidade única e especial. Escondia a cabeça debaixo da caminha, ou de uma toalha, mas quando me via arrebitava. Sempre disposto a muitas festas e turras, a muitos beijos ruidosos na cabeça. A falta de apetite era mais um motivo de preocupação. Durante os dias que esteve internado, não o consegui fazer comer mais do que meia dúzia de pedacinhos de ração. Questionámo-nos se seria o stress de estar num ambiente estranho.

As segundas análises a 6 de Agosto foram animadoras. A creatinina, a ureia e o fósforo continuavam super elevados, (8.8; 121; 8.8), mas tinha havido uma descida. Segundo a veterinária era extremamente positivo havendo apenas estado dois dias a soro.
Nesse mesmo dia assisti à ecografia. Quis estar com ele para o manter mais calmo, e para obter a informação em primeira mão, sem esperas. O resultado foi negativo. A imagem de um rim normal e saudável deixa ver algumas ramificações. A imagem apresentada dos rins eram de duas massas amorfas, escuras, e isso significa que os orgãos não estavam operacionais, tinham ambos entrado em total falência.
A pouca esperança que restava dependia totalmente do Eros. Mais do que nunca era crucial que ele recuperasse o apetite. Não um bocadinho, mas totalmente. Era algo que não iria acontecer na enfermaria, porque aquele malandro até arranjava maneira de vomitar ou cuspir a pasta Renalzin usada para lhe baixar os níveis de fósforo.
Já nem a táctica de lhe esfregar paté no nariz funcionava, porque ele simplesmente deixava-se ficar sujo, sem se lamber.

Logo a 4 de Agosto, a veterinária falou-me sobre o transplante renal em gatos. Mal cheguei a casa pesquisei na internet sobre essa cirurgia. Aliás, todo o meu tempo quando não estava na clínica, era usado em casa a pesquisar sobre esta doença e as terapêuticas. Trata-se de uma intervenção bastante recente em Portugal. Caso seja já realizada no nosso país, (fiquei sem esta certeza), será no Hospital Veterinário Principal. O processo consiste em retirar um rim saudável de um gato dador e transplantá-lo para o gato doente, sem lhe retirar os rins em mau estado. O dador pode ser um gato da família, ou esta deve adoptar o dador.
Foi uma hipótese que eu e o meu marido colocámos de parte. Se por um lado, não nos parece justo retirar um rim a um gato saudável, ainda mais se a probabilidade de um gato padecer de insuficiência renal é tão grande e quase certa na velhice, estariamos dessa forma a ficar com dois gatos condenados, pois teriam ambos só um rim. Isto se o transplante fosse bem sucedido. Simplesmente sentimos que era muito errado fazer de Deus nesta situação, e encurtar a vida de um gato aparentemente saudável para estender um pouco a vida de outro.
A outra vertente é a económica. O transplante custa 10000 euros.

Como a clínica veterinária encerra aos domingos, fomos buscá-lo sábado à tarde. Na melhor das hipóteses esperávamos que, em casa, num ambiente familiar ele acalmasse e mostrasse apetite. Se juntarmos a isso a esperança de que injecções subcutâneas de soro bastante frequentes, continuassem a ter a mesma eficácia que o soro demonstrara ter, aí estava a nossa estratégia para vencer esta guerra.

Chegámos a casa munidos de Renalzin, saquetas de ração renal da Hills e da Royal Canin, paté renal da Royal Canin, seringa para dar Renalzin à força, saco de soro e muitas agulhas extra para lhe fazer a fluidoterapia.
A veterinária mostrou-me no consultório como aplicar o soro. Não deverá ser difícil para quem não tem um medo patológico de agulhas como nós. Basta colocar o saco do soro mais alto do que o gato para que o soro corra. Pegar numa prega de pele na zona das costas, mais ou menos entre as omoplatas, espetar a agulha que está colocada no tubo que liga ao saco do soro na prega com o cuidado de esta não passar de um lado a outro, ligar o soro e esperar até que o animal fique com um "saco", uma "mochilinha" cheia de soro nas costas. O objectivo é hidratar o animal, e fazer com que os níveis de fósforo, creatinina e ureia baixem.

Mal chegámos a casa, servi-lhe das duas rações renais. Ele comeu e bebeu, estava animado, embora magro e fraco. O irmão, Zeus, ou não o reconhecia ou sabia que algo estava muito errado com o Eros, então fugiu dele e bufou-lhe, até ao fim. Talvez seja um mecanismo de defesa, um instinto animal, a ostracização, a distância dos que acabam por não sobreviver.
Foi um castigo dar-lhe o Renalzin. A animação foi breve. Após aquela alegria à chegada, recusava-se a comer e a beber. O pior é que ele era atraído para a zona da comida, miava, mas cheirava o conteúdo das taças e continuava a miar. Mesmo com paté, leite para gatinhos ou a ração habitual que ele tanto gostava, o resultado era o mesmo.
Nessa mesma noite decidimos que o melhor seria levá-lo ao veterinário, logo na segunda feira, para o eutanasiar. O ano passado, em finais de Julho, o nosso Ulisses, que há anos vinha sofrendo de gengivite crónica e tinha que levar uma injecção de dois em dois meses, acabou por falecer em casa, depois de o trazermos do internamento, também a um sábado a tarde. Estava muito debilitado, com dificuldade em respirar e em mover-se. Se pudesse voltar atrás, teria exigido uma eutanásia muito antes de ele chegar aquele ponto. E foi uma lição que nunca esqueceremos, e um choque que nunca será totalmente ultrapassado.

Adoptar um animal é sinónimo de emoções e momentos nada menos que maravilhosos. Também encarreta dores de cabeça e dificuldades, mas nenhuma como esta. Optar pela eutanásia é difícil. É ter que ser racional num momento em que nos afundamos em emoções. No caso do Eros tratava-se de lhe conceder um fim compassivo, antes que maiores sofrimentos e dores surgissem. Era não querer vê-lo ser devorado pela doença. E, sendo a Insuficiência Renal uma doença progressiva e degenerativa, tinhamos a certeza que cada dia que passasse ele estaria notavelmente pior. Mantê-lo indefinidamente internado não seria a qualidade de vida que ele merecia. Isso seria cruel para com ele, e uma demonstração de egoísmo da nossa parte e não de amor.

Não foi uma decisão instantânea. Desde o primeiro dia que ele ficou internado, que as mensagens de uma amiga com o curso de auxiliar de clínica veterinária foram essenciais para acordar o meu lado racional, me colocar os pés na terra.
Avisou-me que em 10 anos nunca viu um gato sobreviver anos com esta doença, avisou-me que se lhe receitassem Lipocortinolo tinha chegado o momento de ele parar de sofrer, que não alimentasse muitas esperanças devido aos contornos da situação, e que estivesse atenta, porque a maioria dos veterinários, senão todos, tendem a aproveitar-se da falta de conhecimento das pessoas, para eles estudarem e nós pagarmos a conta.

Sei que tentámos tudo o que era possível numa situação cujo o triste fim seria inevitável. Enquanto internado fiz-lhe Reiki, brinquei muito com ele, para que se mantivesse positivo e nunca perdesse a vontade de viver, pois presumo que essa força seja tão importante na recuperação dos animais como é na dos humanos, rezei muito por um milagre.
Domingo foi o dia da despedida. Não o quis stressar com a toma de medicamentos. Para quê fazê-lo se não iria alterar o resultado. Quis apenas que ele tivesse um dia feliz. Só bebia água com gelo, então dei-lhe gelo todas as vezes que me pediu. Muito colo, mimos, abraços e beijos.

Quando chegou a manhã de segunda feira, dia 9, levantei-me muito antes da hora de abertura da clínica. Queria passar todos os momentos possíveis com o Eros. Continuava a pedir um milagre, um sinal qualquer do Anjo da Guarda. Quando liguei a televisão, parei casualmente num programa de história e a primeira coisa que ouço é: "o amor é maior do que a morte."
Não podia ser coincidência, porque coincidências não existem. O meu Anjo da Guarda usou a televisão para que me dizer aquilo que eu precisava ouvir para me trazer algum conforto e paz: "o amor é maior do que a morte".

Passava das onze e meia, talvez ainda mais próximo do meio-dia quando a veterinária confirmou que já estava. Estive sempre com ele, todos os segundos. Foi-se a olhar-me nos olhos. Não foi pacifíco, rápido e indolor como qualquer uma de nós, naquele consultório, naquele momento, tinha desejado mais que tudo. Ele estava stressado e hipotenso, logo foram precisas muitas tentativas, três patas e uma sedação, para se conseguir colocar o cateter.
A veterinária pedia-lhe desculpa. Eu fazia tudo por tudo para lhe dar o maior conforto possível.
"Há quem não queira assistir, quem não aguente". Mas era o mínimo que eu podia fazer. Adoptámo-lo e o irmão, ainda bébés. Levantava-me várias vezes durante a noite para o ensinar a comer sólidos. Era o meu menino. Arisco, só em mim procurava colo. Era o mínimo que poderia fazer, assumir o papel de sua guardiã, de sua mãe adoptiva, de quem o tenta confortar e lhe demonstra amor até ao último suspiro. Chorei, regressei a casa com os olhos inchados, mas em paz.

03/08/2010

Arte que se visita: Mirandês - A segunda língua oficial de Portugal



Se soubisse l Padre Nuosso
Cumo sei cantar cantigas,
Andaba siempre rezando
Pu l'alma de las raparigas.

Quien quejir ir pa l cielo
Nun diga que nun ten tiempo,
Puode andar ne l sou serbício
I cun Dius ne l pensamiento.

You pedi la muorte a Dius,
El dixo que nun me la daba:
Que le pedisse la salbaçon,
Que la muorte cierta staba.

Mie Mai de l cielo balei-me,
Que la de la tierra nun puode:
La de l cielo inda stá biba
La de la tierra lhougo muorre.

Cuquelhadica amarradeira,
Nun te amarres ne l adiles:
Que ls pastores son mi malos,
Puodan-te partir ls quadriles
.



Tenho uma "costela" transmontana, o que significa que reconheço bem o espírito desta gente. São pessoas que de certo modo parecem, elas próprias, terem nascido do útero das serras, feitos da mesma rocha. Estas serras dão à luz gentes que, embora de poucas palavras, são pessoas de palavra. Sérias, teimosas, conquistadoras, trabalhadoras, empreendedoras e quase impossíveis de convencer de algo se já se tiverem decidido pelo contrário.
Para mim são os verdadeiros herdeiros de Viriato e do seu espírito.
Não me admira nada que seja então, na região Trás-os-Montes, no nordeste de Portugal, mais precisamente na terra de Miranda de Douro que tenha sido preservadaa língua mirandesa.


"Em terra de boas e ricas tradições, num canto do Nordeste português, fala-se uma língua com um corpo gramatical perfeito (fonética, fonologia, morfologia e sintaxe próprias) que, sem ser portuguesa, vem do tempo da formação de Portugal (século XII): é o mirandês ou língua mirandesa.

De raiz latina (latim falado no Norte da Península Ibérica) e fazendo parte do grupo dos dialectos leoneses, manteve-se, até hoje, por ter vivido à margem desse grupo linguístico e do país a que pertence (acasos da História e entraves geográficos). Em finais do século XIX, descrevia-a José Leite de Vasconcelos como "a língua do campo, do trabalho, do lar, e do amor entre os mirandenses".

Hoje, é usada no dia a dia por 15.000 pessoas das aldeias do concelho de Miranda do Douro e de três aldeias do concelho de Vimioso, num espaço de 484 km2, estendendo-se a sua influência por outras aldeias dos concelhos de Vimioso, Mogadouro, Macedo de Cavaleiros e Bragança

Esta Segunda língua oficial de Portugal já tem uma convenção ortográfica."


Mas, Miranda é uma terra rica em tradições próprias, em peculiares expressões na gastronomia, no artesanato, nas festas dos povoados, em usos e costumes ímpares que a tornam absolutamente inimitável e de um enorme valor.


Os Pauliteiros:

"As famosas danças dos Pauliteiros de Miranda são uma vaga reminiscência das danças pírricas dos guerreiros da Grécia antiga. Imprevista, variada e colorida, a coreografia exige grande destreza dos dançarinos. É, na verdade, uma dança essencialmente guerreira e a sua origem não é certamente nova. Ela é tão velha como o Homem na Península Ibérica. Em mangas de camisa oito homens rudes trazem flores nos chapéus de largas abas, nas costas e nos ombros, encanastrados, fitas de várias cores berrantes. Cada uma representa uma flor: a vermelha, uma rosa, a azul, uma violeta, a branca, uma açucena e a amarela representa o rei. Em cada mão um pau grosso como cabo de martelo, curto como batuta. Avançam, como se caminhassem em campo vasto, à frente de um exército e a dança rompe num arranco de corações em fogo."

Raça Mirandesa:

"A raça bovina mirandesa é a mais notável de Portugal pelas suas aptidões de trabalho, de engorda e de reprodução, e ainda por ser a que apresenta exemplares mais finos, elegantes e bem proporcionados em todos os seus membros. O boi mirandês de raça fina deve ter segundo se diz na região:
três pequenos - cabeça, testa e agulha;
três grandes - meleneira, pelindrengues e estriga de rabo;
três curtos - focinho, pescoço e perna;
três largos - tromba, nuca e «nalgas»;
e três direitos - espinhaço, cana do nariz e perna."


Burro mirandês:

"O burro mirandês é uma raça com características singulares que se encontra em vias de extinção, restam apenas cerca de mil exemplares. Isto levou a que a União Europeia (UE) a considere “raça protegida”.

Actualmente está a ser utilizado na terapia de crianças com problemas especiais. A experiência desenvolvida numa aldeia de Miranda do Douro começa a dar frutos, principalmente no que toca à relação dos mais novos com o exterior.

As características do Burro de Miranda são em resumo:

Altura elevada superando os 1,35 cm ao garrote;

Extremidades do corpo muito grande, com cabeça volumosa, orelhas grandes e fortes, cascos amplos e uma cauda longa;

Pelagem castanha escura, com gradações mais claras nos costados e face interior do tronco, branca no focinho e contorno dos olhos;

Pêlo abundante, comprido e grosso, aumentando em extensão e abundância nos custados, face, orelhas e extremidades dos membros. Crinas abundantes.

Carácter tranquilo, dócil e de grande força de tracção."



Gaita de foles (Gaita de fuôlhes):

"Instrumento tradicional de riquíssimas tradições, que emerge da mais ancestral tradição musical mirandesa. Trata-se de um instrumento de sopro típico desta região que tem um fole feito, tradicionalmente, de pele de cabra."

Posta Mirandesa:

"Nas feiras de onde é originária, era apenas assada na brasa, temperada com sal e comida com pão típico da região.

Hoje em dia, esse belíssimo naco de vitela assada, pode ser encontrado nos principais restaurantes da região, servido com batata a murro numa simbiose perfeita."



Conheça Miranda: http://www.mirandadodouro.com.pt/index.htm

02/08/2010

Arte que se ouve: "Si Do Mhaimeo I", Celtic Woman



Ninguém fica indiferente às influências celtas que ainda que nos rodeiam. Sentimo-nos atraídos pelos mitos desses povos ancestrais, especialmente em países onde estes estiveram presentes, como Portugal. Mantemos essa ligação através da arte, dos símbolos e da música.
Como hoje, aqui se escreveu sobre Arte Celta, "Si Do Mhaimeo I" parece-me um tema apropriado para vos apresentar, na versão interpretada pelas Celtic Woman.
É um dos meus favoritos. E se um dia forem passear pela Serra de Sintra, este tema é a banda sonora perfeita, para em conjunto com a paisagem e o ambiente idílico, vos transportar para uma fantasia digna de Avalon.

"Celtic Woman é um grupo de música formado por cinco artistas irlandesas: as vocalistas Chloë Agnew, Méav Ní Mhaolchatha, Lisa Kelly, Alex Sharpe e a violinista Máiréad Nesbitt. O repertório vai desde canções tradicionais célticas até música moderna. Até agora o grupo lançou quatro álbuns: Celtic Woman, Celtic Woman: A Christmas Celebration, Celtic Woman: A New Journey, The Greatest Journey: Essential Collection e Celtic Woman: Songs from the Heart, e fizeram muitas turnês mundiais.

A popularidade da música céltica fora da Irlanda e da Europa já tinha sido consolidada por artistas como Enya, e por espetáculos como Riverdance e Lord of the Dance, e Celtic Woman já foi inclusive chamada de "Riverdance de vozes"."

in wikipedia

Arte Antiga: Arte Hiberno-Saxónica



"Arte hiberno-saxónica ou arte insular é o estilo de arte produzido após o Império Romano nas Ilhas Britânicas. O termo é usado também para designar a escrita produzida naquele tempo. Naquele período, a Irlanda e a Grã-Bretanha tinham um estilo de arte muito característico.

A Irlanda, a Escócia e o reino da Nortúmbria, no norte da Inglaterra, são os mais importantes centros artísticos, mas outros exemplos também podem ser encontrados no sul da Inglaterra e na Europa continental, especialmente na Gália (França), em centros fundados por missionários celtas. A influência da arte insular pode ser notada em toda arte medieval subsequente, especilamente nos elementos decorativos dos manuscritos românicos e góticos.

O que sobreviveu da arte insular são principalmente iluminuras, trabalhos em metal e gravações em pedra, especialmente cruzes de pedra. As superfícies são ricamente decoradas com padrões intrincados. Os melhores exemplos incluem o Livro de Kells, os Evangelhos de Lindisfarne, o Livro de Durrow, broches tais como o Broche de Tara e a Cruz de Ruthwell. Páginas iniciais chamadas carpet pages são características dos manuscritos da época.


Trabalho em metal

Cálice de ArdaghA maioria dos exemplos de trabalhos em metal existentes foi descoberta em contextos arqueológicos que indicam que tais objetos foram abandonados ou escondidos. Há vários broches, inclusive alguns comparáveis ao Broche de Tara. Quase todos estão no Museu Nacional da Escócia ou em museus locais na Inglaterra. O Cálice de Ardagh é um dos objetos de metal sobreviventes.


Manuscritos


O Cathach of St. Columba, um saltério do século VII é talvez o mais antigo manuscrito irlandês conhecido. Contém letras decoradas apenas no começo de cada Salmo, mas estes já mostram traços distintivos. Não apenas a capitular, mas as primeiras letras são decoradas, em tamanho pequeno.

O Livro de Durrow é o mais antigo Evangelho com decorações completas.
Os Evangelhos de Lindisfarne, produzidos em Lindisfarne são semelhantes ao Livro de Durrow, mas mais complexos. Todas as letras nas páginas iniciais dos Evangelhos são ricamente decoradas em uma composição única. As carpet pages são enormemente complexas e soberbamente decoradas.

O Livro de Kells, datado de 800, sobreviveu quase intacto, mas a decoração não está acabada. Apesar de não apresentar carpet pages, as capitulares são tão decoradas que acabam tendo aquela função. Há mais figuras humanas que antes. As cores são brilhantes e a decoração é enérgica, com várias espirais.

O Evangelário de Echternach.


Cruzes altas

Cruz de RuthwellCruzes altas são grandes cruzes celtas em pedra, geralmente erigidas no exterior de mosteiros ou igrejas. As primeiras, como a Muiredach's High Cross, de influência irlandesa, em Monasterboice, está repleta de imagens do Velho e Novo Testamento. Cruzes mais recentes têm poucas imagens, mas apresentam dimensões maiores, como a Dysert Cross, na Irlanda. A Ruthwell Cross, na Escócia, um pouco destruída pelos iconoclastas presbiterianos, é o exemplos mais impressionante de cruz escocesa."

in wikipédia


No topo: vídeo de conferência sobre o Livro de Kells, duração de 58m.

Saiba mais:

Sobre o livro de Kells: http://pt.wikilingue.com/gl/Livro_de_Kells

Arte Antiga: Arte Celta



Os Celtas

"Os celtas integram uma das mais ricas civilizações do mundo antigo. As origens desta civilização remontam ao processo de desenvolvimento da Idade do Ferro, quando estes teriam sido os responsáveis pela introdução do manuseio do ferro e da metalurgia no continente europeu. De fato, o reconhecimento do povo celta pode se definir tanto pela partilha de uma cultura material específica, quanto pelo uso da língua céltica.

Não compondo uma civilização coesa, os celtas se subdividiram em diferentes povos entre os quais podemos destacar os belgas, gauleses, bretões, escotos, batavos, eburões, gálatas, caledônios e trinovantes. Durante o desenvolvimento do Império Romano, vários desses povos foram responsáveis pela nomeação de algumas províncias que compunham os gigantescos domínios romanos.

Do ponto de vista econômico, podemos observar que os celtas estabeleceram contato comercial com diferentes civilizações da Antiguidade. Por volta do século VI a.C., a relação com povos estrangeiros pode ser comprovada pela existência de elementos materiais de origem etrusca e chinesa em regiões tipicamente dominadas pelas populações célticas.

Por volta do século V a.C., os celtas passaram a ocupar outras regiões que extrapolavam os limites dos rios Ródano, Danúbio e Sanoa. A presença de alguns armamentos e carros de guerra atesta o processo de conquista de terras localizadas ao sul da Europa. Após se estenderem em outras regiões europeias, os celtas foram paulatinamente combatidos pelas crescentes forças do Exército Romano.

A sociedade céltica era costumeiramente organizada através de clãs, onde várias famílias dividiam as terras férteis, mas preservavam a propriedade das cabeças de gado. A hierarquia mais ampla da sociedade céltica era composta pela classe nobiliárquica, os homens livres, servos, artesãos e escravos. Além disso, é importante destacar que os sacerdotes, conhecidos como druidas, detinham grande prestígio e influência.

A religiosidade dos celtas era marcada por uma série de divindades que possuíam poderes únicos ou tinham a capacidade de representar algum elemento da natureza ou animal. Com o passar do tempo, alguns mitos e deuses foram incorporados pelo paganismo romano e, até mesmo, na trajetória de alguns santos cristãos. Atualmente, a Irlanda é o país onde se encontram vários vestígios da cultura céltica."


http://www.historiadomundo.com.br/celta/


Os Celtiberos

"O território peninsular sobre o que se assentam os recém chegados (preceltas) estava habitado por povos preíberos (aparte de geográfico, íbero é um termo cultural). Discute-se muito se produziu-se uma deslocação, uma conquista, uma aliança, assimilação, pacto ou fusão entre celtas e íberos (de bom grau ou como servos). Os dados disponíveis são contradictorios e as teorias dos autores difieren sobre o tema. Inclusive poderia dar-se uma mistura de todas as opções possíveis já que as densidades de população e os recursos disponíveis são muito especulativas. As relações e influências mútuas mudaram com o passo do tempo. Se atestigua uma grande presença precelta em zonas a Bética (actual Huelva, Sevilla) que se tentam explicar mediante a presença de servos, mercenários ou carteiras isoladas de colonos. O evidente é que na península Ibéria falta realizar uma campanha arqueológica séria que possa dar dados fiáveis que permitam reconstruir o passado.

As primeiras referências escritas sobre os celtíberos devem-se a geógrafos e historiadores greco-latinos (Estrabón, Tito Livio, Plinio e outros), ainda que seu estudo, que arranca do século XV, não adquire rango cientista até os inícios do século XX (marqués de Cerralbo, Schulten, Taracena, Caro Baroja, etc.), cobrando renovado impulso nos últimos anos. Pese a este excepcional acervo literário, ainda hoje se discutem aspectos finques para sua definição: os confines de seu solar, sua verdadeira personalidade ou sua própria genealogia.

As fontes clássicas são muito imprecisas com respeito a seu território, ainda que podemos considerar que os celtíberos históricos se estenderam com segurança pelas províncias de província de Soria|Soria]] e Guadalajara, boa parte de A Rioja, este de província de Burgos|Burgos]], oeste de província de Zaragoza|Zaragoza]] e Teruel, quiçá norte de Cuenca e Astúrias; diferentes interpretações ampliam este marco para oriente e ocidente. Podem ser considerados como um grupo étnico, já que incorporam entidades menores (arévacos, tittos, belos e lusones, resultando polémica a inclusión de vacceos, pelendones e berones), sem que isso signifique a existência de um poder centralizado e nem sequer de uma unidade política, salvo quiçá, e de forma coyuntural, por motivo dos acontecimentos militares do século II a. C.

Dado o heterogéneo da informação literária e das evidências arqueológicas da cultura celtibérica, resulta difícil definí-los a partir de um único rasgo; não obstante, consta-nos que falavam uma mesma língua, o celtibérico, cujos depoimentos escritos (utilizando o alfabeto ibério), ainda que tardios, se estendem por um território que vem a coincidir basicamente com o descrito.

Segundo a visão tradicional, explicava-se sua origem como resultado da fusão entre celtas e iberos. Na actualidade, a partir de recentes estudos genéticos, entendem-se como fruto da evolução experimentada por alguns povos célticos peninsulares da primeira Idade do Ferro, sobre os que posteriormente exerceu uma marcada influência a cultura ibera.

A cultura dos celtíberos fez sua a herança dos iberos, de quem adoptaram o sistema de escritura. Depois da queda de Numancia no 133 a. C., seu território passou a fazer parte da província romana Hispania Citerior.

Os primeiros textos celtíberos podem datar-se aproximadamente entre princípios do século II a. C. e o I d. C. O alfabeto utilizado nos textos mais temporões é o ibério, que não resulta do todo adequado para representar os diferentes sons da língua celtibérica. O alfabeto latino já está presente a alguns dos textos mais tardios. Muitas das inscrições contêm uma fórmula onomástica estereotipada, como a que pode se encontrar em uma lápida localizada em Ibiza: "Tirtanos da família de Abolus, filho de Letondu, de Kontrebia Belaiska".

Existe também um bom número de moedas gravadas com o nome celtíbero da cidade ou dos habitantes da cidade em onde aquelas foram acuñadas. Ademais, encontraram-se 20 tesserae hospitais gravadas, pequenas placas de bronze utilizadas como símbolo de pacto entre duas partes, geralmente entre um indivíduo e uma comunidade, com as que o portador podia solicitar hospitalidade ao longo de suas viagens. A maioria destas inscrições são muito breves, com a excepção da tessera de Luzaga (24 palavras)."

http://pt.wikilingue.com/es/Celta


O declínio da civilização Celta

"Os celtas foram o primeiro povo a se submeter ao Império Romano, tanto que no final do século II a.C. a Gália Cisalpina e a Celtibéria já eram territórios conquistados. Sob o comando de Julio César, no século I a.C., a Gália Transalpina foi tomada e, no mesmo período, a Galácia tornava-se província subordinada a Roma. Com as Gálias já conquistadas, as legiões avançaram para as Ilhas britânicas, onde a dominação aconteceu de forma gradativa e foi concluída no fim século I d.C. Enquanto isso, neste mesmo período, as tribos celtas na Europa Central caiam no domínio dos povos germânicos.

Em tese, era o fim da cultura La Tène e a arte celta, assim como concebida, acabou confinada na Ilha da Irlanda, para florescer novamente no início da Idade Média em um ambiente já cristão católico.

Afora a região irlandesa, a tradição e as línguas de herança céltica ainda sobreviveram nas demais regiões habitadas pelos celtas nos últimos anos que antecederam a dominação, como na Cornualha, Ilha Manx e as Highlands escocesas (Reino Unido), na Bretanha (França), na Galícia (Espanha) e na Galácia (Turquia)."

http://www.historiadomundo.com.br/celta/declinio-civilizacao-celta.htm


Arte Celta

"O termo celta (arte), de difícil delimitação geográfica e cronológica, pretende englobar todas as manifestações artísticas produzidas pelos antigos celtas desde o século V a. C. até ao I d. C., altura em que esta civilização entrou em declínio.
A área antigamente ocupada pelos celtas abarcava um vasto território do continente europeu que, desde a Áustria e do sul da Alemanha, se estendia à Suíça e à França, atingindo, na centúria seguinte, a Irlanda, as ilhas do Norte da Inglaterra, a Espanha e o Mar Negro. No período de máxima expansão, o centro de maior pujança da cultura celta deslocou-se da zona embrionária do Reno para a França e posteriormente para a zona ocidental da Europa.

Originária da cultura do ferro centrada na Baviera, a arte celta conheceu vários períodos de desenvolvimento, em diferentes pontos do território europeu. O período de formação - conhecido por La Tène ou estilo antigo, nome derivado de uma região junto do lago suíço de Neuchâtel - decorreu entre 480 e 350 a. C. Caracterizava-se pela produção de obras de joalharia ou bronzes inspirados em modelos etruscos cruzados com referências a motivos orientais, como folhas de acanto, palmetas e flores de lótus.

Seguiu-se o estilo Waldalgesheim (350-290 a. C.), durante o qual se manteve a influência clássica, embora os modelos e as referências formais gregas e romanas fossem utilizados de forma extremamente livre. Datam desta fase as esculturas antropomórficas de deuses, de influência romana.

Durante o período Plástico (290-190 a. C.), que floresceu nas zonas mais ocidentais do continente, realizaram-se representações estilizadas de figuras humanas e animais, cujo fundamento estilístico se prolongou pelo período final da arte celta, conhecido pelo Estilo Espada (designação que deriva das espadas ornamentadas com desenhos lineares e abstractos, inspirados em motivos vegetalistas gregos).
O incremento do clima de instabilidade que dominou as comunidades celtas determinou a necessidade de produção de armas, que rapidamente se transformaram num dos elementos centrais do desenvolvimento artístico desta cultura. Para além da vocação bélica e funcional, muitos destes artefactos respondiam a necessidades simbólicas (enquanto representação de estatutos sociais) bem como religiosas, uma vez que muitos destes objectos constituíam oferendas aos deuses e eram investidos de poderes talismânicos.

Os materiais mais utilizados pelos celtas foram o bronze e o ouro (com origem na boémia), ou outros materiais importados de locais distantes, como a prata, o coral rosa e o âmbar. Este povo utilizava duas técnicas fundamentais de trabalho dos metais: a fundição ou a extrusão de chapa. Uma grande variedade de efeitos decorativos de raiz abstracta e geométrica ou zoomórfica era utilizada para ornamentar as superfícies dos objectos.

Um dos mais conhecidos artefactos artísticos celtas é o tampo de bolsa da barca funerária de Sutton Hoo, realizada entre 625 e 33 a. C., empregando - em solução compositiva simétrica que articulava ornamentos geométricos com imaginativas representações de figuras animais e humanas - folhas de ouros, esmaltes, granadas e outros materiais preciosos.

Apesar da variedade de manifestações locais e das transformações estilísticas experimentadas durante as várias centúrias de desenvolvimento, determinadas em parte pela absorção de influências variadas, a arte celta foi capaz de definir um sistema formal harmónico e coerente. Esta homogeneidade de expressões foi garantida pela franca mobilidade dos artesãos entre as regiões ocupadas pelos celtas, assim como por uma plataforma cultural comum determinada pelas crenças religiosas e pelo sistema político e pujança económica."

http://www.infopedia.pt/$arte-celta

Características da Arte Celta


"A arte celta inovou as artes. Isso se deve a um estilo extremamente peculiar.

Tinha-se grande preferência por temas ligados a natureza: árvores, flores, animais e seres sobrenaturais zoómorfos. Tais temas eram mais comuns que figuras humanas, no entanto, estas também existiam.
O “estilo celta” preferia os compassos, que destorciam e compunham figuras recheadas de espirais, elipses e outras formas curvilíneas entrelaçadas e, por vezes, organizadas de modo concêntrico, a formar representações quase abstratas."

"• Originalidade: o esforço do artista celta por ser diferente a tudo o que era predominante em sua época, bem como em frente a colegas próprios do mesmo oficio.

•Abstracção: se desmaterializa a arte, guardando somente as formas que nos ajudam a distinguir, inclusive às vezes nem isso, as linhas essenciais da figura representada. A arte celta é muito "simbolista".

•Variação nas formas: dentro de um mesmo esquema encontramos-nos com variantes na plantilla geral de um mesmo motivo, já seja animal ou vegetal.

•Imaginação desbordante que supera a obra: muitas vezes a obra só é um pretexto para dar uso à técnica e genialidade do artista.

•Horror vacui: o chamado horror ao vazio, adoptado pelos romanos (veja-se a Coluna de Trajano) também é característica comum da arte celta. Não encontramos practicamente nenhum ponto vazio no espaço disposto pelo artista.

•Preferência pelas figuras de caracter zoomórfico: os animais, já vingam de uma espécie existente ou bem sejam de caracter fantástico, têm preferência à hora de ser incluídos na decoração céltica. Estas figuras normalmente eram de carácter apotropaico, isto é, protector.

•Predominancia da decoração "marginal" em frente ao conteúdo principal: o artista celta pode situar uma cena no centro da obra mas sempre recrear-se-á nos adornos secundários, que, para este, parecem ser o mais atraente e que conjuntan melhor com sua maneira de se expressar."

http://pt.wikilingue.com/es/Arte_celta

Música Celta

Significado

"Os celtas sempre estiveram muito ligados à religião, e assim como quase toda as expressões de sua cultura, a música também estava intimamente relacionada a temas de cunho religioso. Tanto que os músicos eram – em sua maioria – ligados a classe sacerdotal dos Druidas.

A música ou, mais precisamente, o tocar dos instrumentos era considerado uma manifestação do mundo dos espíritos. Sendo assim, o músico era um ser privilegiado, pois suas faculdades lhe permitiam captar pequenas manifestações do Outro Mundo, e desta forma, ele traduzia aquilo que absorveu para a música.

Exatamente por este motivo, é comum a temática musical celta estar ligada aquilo que eles mais respeitavam: a Natureza. Um bosque, a brisa, a alvorada, o outono – ou qualquer outra estação – enfim, cada pequeno movimento da Natureza carrega um som, e era função do músico senti-lo e traduzi-lo em música.

Com o advento da cristandade no mundo céltico, toda esta conotação entre religião e música, de certa forma, se perdeu. No entanto, os “motivos ligados a Natureza” mantiveram-se vivos, e até hoje estão presentes no trabalho de cantores e instrumentistas contemporâneos."

Instrumentos

Os instrumentos celtas são todos bem característicos, isso porque a música folclórica irlandesa conservou fortes traços da música celta. E através desta herança rica e ímpar, a Irlanda lega ao mundo esplendorosas sonoridades, todas com um estilo único e incomparável.

A vasilha de prata conhecida como o caldeirão Gundestrup constitui um dos mais enigmáticos vestígios do mundo celta. Decorado em alto-relevo, apresenta cenas que oferecem uma visão dos mitos e da religião celta, embora seu significado preciso permaneça oculto. As figuras representadas eram originariamente revestidas com folhas de ouro e tinham olhos de cristal azul e vermelho.

Pois bem, mais um exercício mental. Pense na Irlanda, pense na música irlandesa. Que instrumentos lhe vêm a mente? Acho que muitos responderão a harpa ou a flauta. Agora, pense na música escocesa. Qual o primeiro instrumento que você imagina um escocês tocando? A maioria, certamente, dirá a Gaita de Foles.

As características da musicalidade celta foram absorvidas pela cultura mundial, portanto, a grande maioria das pessoas tem, ainda que vaga, uma idéia sobre o que foi – ou melhor – o que é a música e os instrumentos que estavam presentes no folclore ancestral.

Além da flauta, harpa e gaita de foles, (...), ainda resta um importante instrumento – de percussão – chamado Bodhran."


http://www.historiadomundo.com.br/celta/arte-aquitetura-celta.htm

31/07/2010

Arte das Coisas Simples



Como é bom aproveitar o fim da manhã, de um qualquer sábado ou domingo solarengos, para parar no mercado de Almoçageme.
Trazer pão saloio, ferraduras. Mordiscar um pão com chouriço quentinho enquanto se escolhe vegetais viçosos de cores inebriantes, gengibre e frutas. Trazer uma fiada de cabeças de alho saída das mãos de um avô.
"Os rabanetes, colhi-os hoje lá da horta" - Caramba, não é todos os dias que se ouve algo assim.

imagem: mercado de Almoçageme, fonte: net

Arte de Bem Comer: Restaurante "Adega das Azenhas", Colares, Sintra



Para quem não conhece, as Azenhas do Mar é uma aldeia no litoral do concelho de Sintra. Mesmo ao lado, a Praia das Maçãs e a Praia Grande. Não muito longe, a Praia da Adraga.
Conhecida por ser um cenário encantador e pitoresco, com o seu casario branco no estilo português suave, as piscinas escavadas na rocha e, o seu miradouro que assenta sobre arribas de onde se aprecia uma vista magnifíca do Oceano Atlântico em toda a sua amplitude.

E é à beira da estrada principal, a Avenida dos Melhoramentos, mesmo à entrada das Azenhas, com o mar pela direita, que encontramos o edifício de uma centenária adega, que desde 1999 foi transformado no restaurante Adega das Azenhas.
A decoração é rústica e pitoresca. O tecto, muito alto, forrado a madeira e, as paredes de pedra repletas de objectos decorativos, dos quais a imensa colecção de patos e patinhos de cerâmica saltam à vista, para além de objectos típicos, é bastante acolhedora.

É um restaurante onde me sinto bem quando vou na disposição de desfrutar de uma refeição sem pressas. A comida é caseira. Bem confeccionada e servida, nunca me decepcionou. Embora as especialidades sejam o bacalhau à azenha, os filetes com arroz de tomate, as costeletas de borrego, o coelho ou o cabrito à saloia, entre outras, os diversos peixes grelhados e a vitela à azenha que já provei deixaram-me plenamente satisfeita.
Quanto às sobremesas, a carta também é diversa, mas ressalto os doces conventuais como o pão de rala ou os fidalgos.
Trata-se de um local bastante procurado. Especialmente aos fins de semana é frequente encontrar pessoas à porta à espera de uma mesa, portanto aconselha-se reservar com antecedência.
O preço médio por pessoa ronda os 15 euros.



Adega das Azenhas

Avenida Comissão de Melhoramentos, 5
Azenhas do Mar
2715-105 - Sintra

Tlf. 219281357

Tipo de Cozinha: Tradicional portuguesa
Encerra: às quintas-feiras
Ambiente: Informal
Lotação: 120
Métodos de Pagamento: aceita Multibanco
Fumadores: Proibido fumar
Eventos e Grupos: Aceita
Horário de Funcionamento: Das 12.00 h às 15.30 h e das 19.00 h às 22.00 h.

imagem: Adega das Azenhas, in site da Cms.

Arte dos Símbolos: Telha

Inicio aqui mais uma temática - Arte dos Símbolos - que se dedicará, como o nome indica, à simbologia.

Telha:

"Além do significado familiar da telha, que vem do telhado, o uso deste objecto exprime-se simbolicamente na linguagem maçónica: telhar ou cobrir o templo é abrigá-lo das intempéries que resultam da invasão de profanos, das influências do exterior. Telhar o candidato à entrada é certificar-se , através de um questionário apropriado, da sua pertença ao grupo e do seu grau. Sem ser telhado ou coberto, o templo deixa entrar a chuva, daí a expressão está a chover para designar a intrusão de profanos na assembleia. a telha simboliza a protecção do segredo e, no seu sentido nocturno, o fechar à influência espiritual e às forças evolutivas, um virar-se para o adquirido e instalado. A partir daí, o segredo corrompe-se e esvazia-se de sentido."

in Dicionário dos Símbolos

30/07/2010

Arte que se ouve: "Ventura Highway", America



"Ventura Highway" é o meu tema favorito dos America. A sua melodia e harmonia lembra-me sempre dias de Verão e uma suave brisa, cabelos ao vento, uma sensação de liberdade, algo profundamente estival.


"America é uma banda britânica de folk rock muito popular no início e meio dos anos 1970 e agora mais conhecida por seus sucessos como "A Horse With No Name" e "Sister Golden Hair." Embora eles não fossem muito aceitos pelos críticos, a banda teve excepcional sucesso comercial na venda de seus dois singles e álbuns. Apesar de cantores consagrados como James Taylor e Rod Stewart fazerem parte da Warner Brothers Records o grupo que mais vendeu discos neste selo na década de 70 foi America.

História
Gerry Beckley, Dan Peek e Dewey Bunnel eram três americanos muito jovens, que na época em que foram descobertos (por Jerry Lordan), em 1970, viviam em Londres. Seu som acústico, quieto, causou surpresa e fascínio. O America teve dois grandes hits internacionais seguidos, 'A Horse With No Name' e 'I Need You', ambos tirados de America, seu primeiro álbum, de 1971. Com este álbum, venceram o Grammy de banda revelação de 1972. A música do America, então, era uma versão refinada (não melhor, porém) do folkanglo-americano de Crosby, Stills & Nash. Beckley, Peek e Bunnel tocavam e cantavam imitando (talvez não intencionalmente) Neil Young. Até meados dos anos 70, pelo menos, America foi um nome sólido, com álbuns acima da média e hits de médio impacto, como 'Tin Man' e 'Sister Golden Hair'. No Final dos anos 90, o America, com a mesma formação, ainda estava ativo, vivendo de suas antigas glórias."

in wikipedia


Site oficial: http://www.venturahighway.com/

Arte que se ouve: "Nobody's fault but mine", Beth Rowley



Quando, há pouco tempo, ouvi a versão de "Nobody's fault but mine" de Beth Rowley, estava longe de imaginar que aquela voz fantástica pertencia a uma "menina" inglesa nascida em 1981.
Os géneros bluegrass, gospel, soul, jazz e country foram as influências que serviram de base à construção do seu próprio estilo.
Cresceu a tocar guitarra, a cantar blues, e a ouvir velhos vinis de Woody Guthrie com o pai. Aos 15 anos iniciou a sua primeira banda, e aos 17 foi descoberta. Não passou despercebida e garanto-vos que é dona de uma voz hipnotizante.
"Little Dreamer" é o seu albúm de estreia e foi lançado em 2008. Incorpora o tema tradicional "Nobody's fault but mine".

Arte que se ouve: " I Cover the Waterfront", John Lee Hooker



O meu gosto musical é eclético. Acho que se deve sobretudo à minha curiosidade, à vontade de querer entender e sentir o mundo e as pessoas que nele vivem ou viveram. Ouvir música de todo o mundo é uma forma de ligação, porque a música carrega o espírito das gentes, as suas vivências. É estar perto de alguém do outro lado do planeta, ouvir-lhe as confidências.
Mas tenho que confessar que tenho um gosto especial por blues, pelos delta blues, aqueles que tiveram origem em redor do Mississipi.
Quem conhece e aprecia, há-de com toda a certeza entender-me quando afirmo que ouvir algo assim é algo de sublime. Não me lembro de música com mais profundidade e alma. E, se por vezes, um qualquer artista de outro género musical nos faz arrepiar, os blues entram até ao mais profundo das entranhas, até à espinha, até à alma.

Trago-vos "I Cover the Waterfront" interpretado por John Lee Hooker.



"John Lee Hooker (22 de agosto de 1917 - 21 de junho de 2001) foi um influente cantor e guitarrista de blues americano, nascido em Clarksdale, Mississipi.

A carreira de Hooker começou em 1948 quando ele alcançou sucesso com o compacto "Boogie Chillen", apresentando um estilo meio falado que tornaria-se sua marca registrada. Ritmicamente, sua música era bastante livre, uma característica que ele tinha em comum com os primeiros músicos de delta blues. Sua entonação vocal era menos associada à música de bar em relação aos outros cantores de blues. Seu estilo casual e falado errado seria diminuído com o advento do blues elétrico das bandas de Chicago mas, mesmo quando não estava tocando sozinho, Hooker mantinha as características primordiais de seu som.

Ele o fez, entretanto, levando adiante uma carreira solo, ainda mais popular devido ao surgimento de aficcionados por blues e música folk no começo dos anos 60 - ele inclusive passou a ser mais conhecido entre o público branco, e deu uma oportunidade ao iniciante Bob Dylan. Outro destaque de sua carreira aconteceu em 1989, quando se juntou à diversos astros convidados, incluindo Keith Richards e Carlos Santana, para a gravação de The Healer, que acabaria ganhando um Grammy.

Hooker gravou mais de 100 álbuns e viveu os últimos anos de sua vida em São Francisco, onde era dono de um clube noturno chamado "Boom Boom Room", nome este inspirado em um de seus sucessos."
in wikipedia


http://www.johnleehooker.com/

Homenagem: António Feio



Hoje, em todos os meios de comunicação, fala-se de António Feio. Fala-se da sua vida e obra enquanto actor e encenador, e da sua morte. Hoje, o luto não se faz em silêncio, mas sim, através da palavra. Neste momento é impossível conseguir aceder ao site do actor: simplesmente não comporta mais visitas. Em qualquer site noticioso, ou até blog pessoal, abunda não só a cobertura desta notícia, mas também os comentários das muitas pessoas que quiseram deixar algumas palavras de homenagem.

Desta vez não se trata de uma morte inesperada. Há um ano e meio que António Feio travava uma batalha com o cancro do pâncreas, sem nunca desistir da vida. Não por medo da morte, como confessou numa das muitas entrevistas que deu ao longo deste período, mas pelo prazer de viver.
Mesmo, com toda essa força de vontade e, a vontade colectiva de imensos admiradores e amigos a desejarem honestamente que essa sombra do cancro desaparecesse de vez, as diversas aparições televisivas ou na imprensa foram uma espécie de cronologia da doença. De foto em foto, de entrevista em entrevista, ia aparecendo um António mais marcado, de semblante mais doente e frágil, mas ainda o mesmo António.

Para mim o especial no António Feio, não era somente o seu trabalho, muito menos o facto de ser uma pessoa conhecida, famosa. Do António emanava uma simplicidade e uma humildade, algo com que nos fazia simpatizar imediatamente com ele, senti-lo como alguém que se conhece. Uma certeza de que se nos cruzássemos com ele, seríamos bem recebidos.
Para além de tudo o resto, é também digna de respeito e admiração, a forma como preparou a sua partida. Tenho a certeza que se sentiu acarinhado por todo um país.
Deixo-vos aqui a mensagem que António quis deixar ao mundo.

Crónica da Carica: O que é um bom restaurante?


Como todas as pessoas, fui desenvolvendo, ao longo da vida, a minha própria relação com a comida. Gosto de aprender sobre os alimentos, a sua confecção e sobretudo, apreciar as refeições, no que toca igualmente a sabor, companhia e ambiente. Este é simplesmente um reflexo da vida adulta. Quando o tempo livre escasseia, estes momentos ganham uma nova dimensão e um valor redobrado.
O mais engraçado é que quanto maior é o meu gosto e interesse em redor das questões gastronómicas, mais restaurantes entram na minha "lista negra".
Na minha opinião, um restaurante que apenas sirva comida não cumpre o seu papel na totalidade. Um restaurante tem o dever de servir boa comida. Sinto-me frustada quando pago para comer algo que tenho a certeza que eu faria melhor na minha cozinha, a uma fracção do preço.

Mas, afinal de contas, o que é um bom restaurante?
Quando penso nisto algumas variáveis saltam à vista, como a comida, o preço, o atendimento, o ambiente.
Acima de tudo sou uma pessoa simples. Facilmente prefiro um restaurante pouco requintado, onde nos sintamos bem acolhidos, do que um local demasiado faustoso. As melhores memórias gastronómicas que guardo vivi-as em restaurantes menos sofisticados. Algumas retenho-as desde a minha infância, como o maravilhoso cozido de grão que comia em Canal Caveira, com os meus pais, a caminho da casa dos meus avós. Ou nas idas tão frequentes, também com os meus pais, ao antigo restaurante "o Lagar", na zona saloia, onde nos esperava um saboroso cabrito à lagar.

Sou simples, mas sou exigente. Na minha perspectiva é justo esperar, ao entrar num restaurante, que a comida seja bem confeccionada, com ingredientes de qualidade e saborosa. Que o preço seja justo. Que os empregados tenham boa apresentação e saibam atender com simpatia, profissionalismo e eficiência. Que, independentemente da decoração, de mais ou menos requinte, a higiene seja levada muito a sério, inclusivé nas casas de banho. Que no caso de haver música ambiente, esta não esteja tão alta que impeça a conversação à mesa, porque ninguém se ouve. Que o espaço entre as mesas não seja tão parco, que se alguém tiver que passar no meio significa quase encostar a bunda na cara de quem está sentado.

A gastronomia é uma das expressões da cultura de qualquer país, tão válida quanto qualquer outro tipo de arte.
Se pareço exigente quanto ao que espero de um restaurante, é porque toda a vida estive cercada por bons exemplos. Para além de um tio chef, também os meus pais trabalharam no ramo da hotelaria toda a vida, colaborando em hóteis de renome. Também eu trabalhei durante alguns Verões com eles e pude aplicar aquilo que só conhecia em teoria, dos muitos manuais que encontrava lá por casa.
Enquanto empregada de mesa de um hotel de quatro estrelas, sempre tive a consciência de me apresentar com a postura que se espera de um profissional do sector, mesmo que fosse apenas uma ocupação temporária de Verão. Não tinha mais de 18/19 anos na altura, mas assumia a responsabilidade de dar ao cliente o melhor atendimento que eu poderia providenciar, com simpatia, farda sempre impecável acompanhada de um sorriso e bons modos.
Mesmo quando desempenhei esse papel numa conhecida pizzaria, continuei com a mesma postura com que servia num hotel 4 estrelas, o que era altamente apreciado pelos clientes e pela gerência. Com os meus pais como exemplo, nem poderia ser de outra forma.

A partir dessa altura foi-me muito fácil perceber o meu pai, porque motivo ele se irritava facilmente quando íamos a um restaurante, bar ou café e éramos atendidos, por quem, claramente não tinha a menor vocação nem formação para trabalhar em restauração.
Infelizmente é o que existe de mais comum por aí: estabelecimentos abertos por quem não percebe nada do que é bem servir, de como estabelecer uma boa casa. Existem honrosas excepções de pessoas que, embora não tenham a formação, têm a vocação, o gosto, sobressaem pela forma como recebem e não os imaginamos em mais lado nenhum.

Depois existem os maus casos, tão frequentes, os que vou colocando na tal "lista negra". Aqueles em que não deixamos gorjeta como protesto silencioso, para os quais esboçamos um sorriso amarelo à saída, enquanto juramos solenemente em silêncio nunca mais voltar. Aqueles que para mim são inferiores a uma bela falafel ou até um hamburger comidos no shopping.

Cá em casa estamos a caminho da cura para as más experiências gastronómicas. Um dos passos foi a jura solene de recusar todos os convites para jantares de grupo, mais especificamente aqueles jantares de aniversário com ementas pré-definidas, onde nos servem os mais que dejá vú bacalhau com natas e bifinhos com cogumelos.
O ano passado, depois de uma má experiência na praia de Carcavelos, chegámos à conclusão que já não temos, nem idade nem pachorra, para dividir doses microscópicas de comida sensaborona com uma mesa repleta de estranhos, com quem estamos colados pelos cotovelos, sem conversa possível por falta de assunto e porque o tipo do karaoke gosta demais de ouvir a própria voz. E ainda pagar uma nota pela experiência dolorosa.

28/07/2010

Arte que se lê: "Caim" de José Saramago



Hoje falo de Saramago. Também este espaço deve uma referência ao que é o Prémio Nobel da Literatura de 1998. Digo "o que é" ao invés de "o que foi", porque no caso das artes, somente o homem morre. Como todos os outros, desmaterializa-se até fazer parte da própria terra. Mas, enquanto houver gente, há memória, logo a obra fica, passa de mãos, voa por aí largando sementes.
Comecei a ler Saramago apenas há poucos anos. Confesso que me faltava a motivação para começar. Pensei que me assustaria, ou que me faltaria a paciência, com a forma de expressão pouco ortodoxa, nada formal, pela qual Saramago era conhecido. Mas acabou por ser essa sofreguidão que me fez render, essa sensação de um livro que parece apresentar-se sem espaço para inspirações nem expirações, de um só fôlego.

Escolho "Caim" sem qualquer despeito pela sua restante obra. Simplesmente porque foi um dos livros que trouxe de uma Feira do Livro este passado fim de semana.

Um excerto:

" A sua primeira morada foi uma estreita caverna, em verdade mais cavidade que caverna, de tecto baixo, descoberta num afloramento rochoso ao norte do jardim do éden quando, desesperados, vagueavam à procura de um abrigo. Ali puderam finalmente, defender-se da queimação brutal de um sol que em nada se parecia com aquela invariável benignidade de temperatura a que estavam habituados, constante de noite e de dia, e em qualquer época do ano. Abandonaram as grossas peles que os sufocavam de calor e mau cheiro, e regressaram à primeira nudez, mas, para proteger de agressões as partes delicadas do corpo, as que andam só mais ou menos resguardadas entre as pernas, inventaram, utilizando peles mais finas e de pêlo mais curto, aquilo a que mais tarde virá a chamar-se de saia, idêntica na forma tanto para as mulheres como para os homens. Nos primeiros dias, sem terem ao menos uma côdea para mastigar, passaram fome. O jardim do éden era ubérrimo em frutos, aliás não se encontrava lá outra coisa de proveito, até aqueles animais que, por natureza, deveriam alimentar-se de carne sangrenta, pois para carnívoros vieram ao mundo, haviam sido, por imposição divinam submetidos à mesma melancólica e insatisfatória dieta. O que não se sabia era donde tinham vindo as peles que o senhor fizera aparecer com um simples estalar de dedos, como um prestidigitador. De animais eram, e grandes, mas vá lá saber-se quem os teria matado e esfolado, e onde."´

http://www.josesaramago.org/

24/07/2010

Crónica da Carica: Os sisos



Os registos mais antigos da prática da odontologia datam de há 5000 anos, no Antigo Egipto. Os faraós tinham ao seu serviço dentistas e até já havia sido inventada uma receita de pasta de dentes. Muito mais tarde surgiram os "tiradentes", figuras que eram encontradas nas praças por quem precisava de retirar um dente, por vezes era mais uma função acumulada pelo barbeiro.

Paralelamente a estes, já existiam aqueles que se denominavam dentistas e que, através de constantes invenções, ajudaram à evolução da odontologia. Graças a estes últimos já não corremos o risco de nos colocarem uma tenaz na boca, e nos arrancarem três ou quatro dentes saudáveis, deixando o cariado.

Mesmo com todas as notáveis evoluções nesta área, uma mão basta-me para enumerar quem, dos meus conhecidos, não fica sem pinga de sangue só de pensar em ir ao dentista. E eu pertenço ao clube dos nada corajosos nesta matéria. De tal forma, que já nem me lembrava da data da minha última ida ao dentista.

Nos últimos anos devido a este meu medo, decidi confiar que um número diligente de escovagens diárias e uso de elixir me poupariam de males maiores. Mas desde que vi os meus vizinhos do lado, cinquentões, algo desdentados, um temor apoderou-se de mim e, quando o meu marido precisou de arranjar um dente, decidi arranjar coragem para ir com ele.

Após a primeira consulta de diagnóstico, saí feliz da clínica. Os meus dentes estavam em boas condições: cinco cáries, (nada de grave), algum tártaro que já desapareceu com uma limpeza, (algo que juro fazer sem falta de 6 em 6 meses a partir de agora), e por fim, arrancar os dentes do siso, (inclusos e que, por falta de espaço, foram fazendo pressão entortando alguns outros dentes). Também me aconselharam a usar aparelho, o que ao fim de cerca de um ano, me trará dentes absolutamente direitos e alinhados. Mas, uma coisa de cada vez...

Dia 13 saímos ambos radiantes, embora atordoados, com o sorriso imaculado que surgiu após a limpeza. Passado exactamente uma semana voltámos. Tentei preparar-me psicologicamente o melhor possível para alguém que iria arrancar os dentes do siso. O plano era esse. Torcer para que saíssem facilmente e retirar os quatro na mesma sessão, para só ter que passar uma vez pelo martírio da extração e da recuperação. E, pelo que fui lendo na internet, existem alguns que tiveram essa sorte.

Contudo, não foi o meu caso. Uma hora inteira de boca aberta, de olhos fechados, mãos cerradas a torcerem uma ponta da túnica com toda a força, lábios doridos da pressão dos instrumentos, paragens para mais uma anestesia e outra e outra. Todas as vezes em que tentava relaxar, respirar profunda e calmamente, fugir com a minha mente para outro lugar, eram constantemente frustadas por uma sensação que eu nem sabia ler como dor ou a horrível pressão de arrancar aquele malfadado dente do seu casulo. E depois ainda a busca pela raíz partida...

Mas o ser humano é fantástico na forma como se adapta a tudo. No próprio dia, e no dia seguinte, chorei, estava absolutamente arrependida de ter iniciado este tratamento, (pois que ainda faltam mais três sisos!), me custava horrores a trocar a compressa para estancar o sangue, jurava que ainda podia sentir as mesmas sensações de dor e pressão que senti aquando o procedimento, como se o meu corpo estivesse a fazer o luto por um membro perdido, as sensações de um membro fantasma.

Hoje, passados alguns dias noto que o meu espírito se vai levantando conforme vou sentido um milimétrico regresso à normalidade. É bom que assim seja, até porque na próxima terça-feira tenho consulta marcada, para retirar os pontos e quem sabe, arrancar mais um.

23/07/2010

Arte de bem comer: Choco frito à moda de Setúbal



Há anos que devia uma visita a Setúbal para provar, finalmente, o famoso choco frito que tanto as minhas amigas setubalenses elogiavam.
Basta percorrer a longa avenida Luisa Todi e fica-se sem dedos para contar a quantidade de restaurantes, muitos deles, lado a lado, com a sua esplanada, a sua oferta de peixe fresco, o empregado que nos convida a entrar e, sim, todos eles, com o famoso choco frito na ementa.
Lá nos sentámos à mesa de uma esplanada de um desses inúmeros restaurantes, quase em frente ao porto, onde turistas embarcam para Tróia. Fui avisada de antemão que deveria pedir somente meia dose de choco frito. Confesso que é um tipo de bicho que, como alguns outros, só como se vier assim "disfarçado". Um dedo de conversa e lá vem a minha meia dose de choco, enorme, acompanhada de batata frita. À parte, uma salada de tomate, alface, cebola e pimento assado. Para o marido, uma dourada escalada no ponto!
Foi uma meia dose que deu luta, pela quantidade, mas não ficou nem um pedaço. Agora também eu só tenho elogios no que se refere a este prato da gastronomia setubalense.
E, que bem que se comeu em Setúbal. Doses fartas, bom atendimento, produtos de qualidade e uma conta só de 24€.

Um projecto: 1 € - 1 Causa Animal


Confesso que demorei a aderir às redes sociais. No entanto, depois de muitos convites, acabei por me juntar também ao Facebook. Acima de tudo, por ser uma óptima forma de manter o contacto com antigos colegas de faculdade. Não tardou muito que a minha rede de amigos se alargasse com a inclusão de pessoas que nem sequer conheço pessoalmente, mas com as quais partilho elementos em comum. No meu caso, o amor pelos animais e a vontade de fazer algo em sua defesa foi o ponto comum que me levou a conhecer muita gente que muito faz neste sentido.
Não me arrependo em nada, pois sinto que é algo que veio enriquecer a minha vida. Contudo, é algo frustante e doloroso, ler tantos apelos, tantos pedidos de ajuda para salvar animais dos canis de abate, do abandono, da crueldade, da violência, de maus donos, da vida na rua, e pouco ou nada poder fazer. E, saber que esta realidade é muito mais ampla do que se lê no Facebook é aterrador.
E então, do nada, surgiu uma ideia: se todos os imensos amigos dos animais, esses imensos milhares que gostam das páginas das associações como a meritória União Zoófila, contribuissem semanalmente com 1€ para ajudar uma Causa Animal, (associação, canil, gatil, santuário), então todos juntos poderiamos fazer a diferença, ajudar os voluntários que fazem tanto pelos animais necessitados e que lutam diariamente com a falta de meios.
E foi assim que este Grupo no Facebook nasceu, a 10 de Maio de 2010 e já vamos na 7ª Causa Animal!

Link para a página de 1€ - 1 Causa Animal:
http://www.facebook.com/group.php?gid=118024238232219&v=app_2373072738#!/group.php?gid=118024238232219&v=wall

imagem: de Luciano Cavaco - logotipo do projecto

Arte que se lê: "The Complete Book of Drawing" de Barrington Barber



Ainda andava na escola primária quando o meu pai me ofereceu os meus primeiros livros que ensinavam a desenhar. Lembro-me perfeitamente que um debruçava-se sobre nus e o segundo sobre animais selvagens. Fê-lo para acarinhar e incentivar algo que nasceu comigo, da mesma forma que o fez mais tarde com a minha escrita quando me ofereceu uma máquina de escrever.
Tenho algumas memórias desse tempo e algumas são cómicas como os meus pais terem que acalmar a professora, (sobre a tal compra dos livrinhos), pois enquanto os meus coleguinhas desenhavam casinhas e sóis, eu parecia-lhe preocupadamente precoce com os meus nus.
Bem, durante muito, muito tempo, deixei de desenhar. Mas a verdade é que não poderia passar toda a vida afastada de algo que gosto mesmo, que acho que me é inato, pois não fui influenciada por ninguém para forçar o nascimento deste gosto. Mas, desenhar é como andar de bicicleta, não se desaprende mas enferruja-se.
Então, mais uma vez encontrei um livro que acredito ter estado à minha espera, como acontece com todos os únicos exemplares que alguém toca. Esse livro de Barrington Barber, chama-se "The Complete Book of Drawing - Essential Skills for Every Artist" e é fabuloso para todos os que queiram aprender a desenhar ou a melhorar as suas aptidões, independentemente do seu nível. Gostei imediatamente deste livro porque logo nas primeiras dez páginas estão explicados conceitos, como a de se usar o polegar, de forma inteligível, e que por vezes parece tão difícil a um autodidacta "sacar" essa informação. Está repleto de gravuras, explicações e exercícios de todos os níveis, para que se ganhe a confiança necessária.

26/03/2010

Arte que se lê: "Xamanismo" de William Adcock


A vida é antes de mais uma enorme viagem de conhecimento. Para mim, a espiritualidade tem sido uma importante parte nessa viagem. Ao longo da minha existência tem sido grande a minha curiosidade e a minha fome de saber sobre as várias rotas que o Homem tem tomado para se ligar ao que é Superior, Intangível e Espiritual.
Quando me perguntam pela minha religião normalmente respondo "sem rótulos". Desde miúda que sempre acreditei que nenhum de nós precisa de intermediários para falar com Deus, para aceder a um estado mais elevado de consciência. Que, se Deus, se o Espírito Criador está em toda a parte, então era para mim natural que sentisse mais à vontade para estabelecer uma ligação ao comtemplar a natureza do que num edifício.

Fiz sempre questão de seguir o lema que nos ensina que todo o Homem é seu Mestre e Aprendiz e que é nesta perspectiva que devemos também encarar o próximo. Por isso, conforme o meu "apetite" vou-me dedicando ao estudo de várias matérias nesta área, edificando o meu conhecimento com aquilo que considero o "trigo" e despojando-me do "joio".
A minha grande e essencial regra é a de que, neste mundo de dualidade, de luz e sombra, eu aceito a minha sombra mas escolho em plena consciência a Luz e o que está de acordo com este registo.
Assim já fui colocando alguns frutos na minha cesta de campos como a Bíblia, o Alcorão, o Shantideva, o Tarot, o Reiki, a Meditação, Astrologia Kármica, Numerologia, Viagem Astral, Allan Kardec, Maçonaria, Hermetismo, Templarismo e Rosacruz, (etc), assim como com o que aprendo comigo e com todos os que me rodeiam. Não me tornei Mestre de nada, mas decerto um melhor Aprendiz.

Na sociedade de hoje acredito que são cada vez mais as pessoas que fazem a sua busca individual pela Espiritualidade, procurando algo com que se sintam em sintonia. Por ser uma busca individual, os caminhos por mim tomados irão sempre diferir num ponto ou outro de todos os outros "peregrinos". Um dos campos que intuitivamente fui visitar foi o do xamanismo.

Senti o xamanismo como algo natural e inato. Aqui o mundo dos sonhos tem uma relevância primordial que, de uma forma sem explicação, sempre conheci e sempre me disse muito. Desde criança que adoro dormir, que me era extremamente fácil voltar a um sonho, viajar no éter, sonhar a cores. Sempre tive a sensação de que trabalhava mais a dormir do que acordada, ainda tenho...

Igualmente, deste tenra idade sempre senti uma enorme empatia com os animais, uma facilidade em comunicar com estes, uma ligação com os que me são mais chegados. Sei que soa a coisa de gente doida, mas é algo tão simples como ouvir um cão ladrar, um gato miar e saber, na maioria das vezes exactamente o que querem dizer.

Sei que não existem coincidências, existem sim coisas que nos fazem pensar. Uma delas foi logo quando surgiu o meu interesse pelo xamanismo, (talvez um dia aqui relate essa minha aventura), passado muito pouco tempo uma senhora instalou o seu consultório no mesmo prédio onde moro. Não teria nada de notável não fosse ela uma xamã. Pareceu-me fantástico por meses antes nunca sequer ter ouvido falar do tema, nem sequer ter partilhado os meus pensamentos sobre tal.
Mesmo assim, não tão fantástico quanto outro episódio. O estudo do xamanismo levará qualquer um de nós, a seu tempo, a descobrir e a ser descoberto pelo seu animal de poder, a conhecê-lo e a criar unidade com o mesmo,(o nosso aliado espiritual que através da forma e das características desse determinado animal se adequa a cada um de nós, às nossas forças, fraquezas, lições que temos que aprender e missão de vida). Pois bem, certo dia na sessão de meditação em grupo, a nossa amiga que guiava as sessões sugeriu que a última hora fosse usada para enviarmos vibrações de amor e cura a cada uma nós, como numa roda de cura. Foi nesse dia que tive o primeiro vislumbre do poder, da beleza do papel do curandeiro e da utilidade do xamanismo e do animal de poder, mesmo nos dias de hoje, tão distantes das tribos uralo-altaicas da Sibéria onde se crê que o xamanismo surgiu há muitos milhares de anos. De olhos fechados, enquanto meditava, vi o meu animal dirigir-se primeiro a uma das participantes e depois a outra. Farejou ambas demoradamente, a uma lambeu-lhe o peito e a outra uma mão, olhando de seguida para mim. Após partilhar isto naquele dia com as minhas colegas, fiquei a saber que uma delas tinha cancro da mama naquele peito, e a outra tinha passado o dia com dores naquele pulso.

Deixo-vos um excerto do livro que hoje vos trago. É um livro pequeno, com bastantes ilustrações, uma boa base para quem tem curiosidade sobre este tema. Infelizmente até à data é o único livro que encontrei à venda em livrarias sobre xamanismo.

"O xamanismo é essencialmente um estado de espírito, um modo de ver a vida como um todo. O xamã adquire discernimento e sabedoria ao ligar-se a outras partes da Criação e restabelecendo as divisões existentes entre as diferentes partes. Essas divisões podem ocorrer em toda a parte: dentro do próprio eu, dentro dos grupos, entre as pessoas e o meio, e assim sucessivamente.
A palavra "xamã" deriva do dialecto tungue das tribos uralo-atalaicas da Sibéria. Os xamãs eram os sacerdotes-médicos das tribos, responsáveis pela celebração de cerimónias e rituais, tratando dos doentes e cuidando de todos os aspectos relacionados com o bem-estar das pessoas.
O xamanismo não reconhece idade, sexo, raça ou doutrinas religiosas e, por isso, está disponível para todos. Na verdade, muitas pessoas têm experiências xamânicas sem as intitularem como tal. Poderia mesmo dizer-se que algumas descobertas científicas foram impulsionadas por experiências xamânicas. Os seres humanos são uma parcela da Criação, e o xamanismo é o nosso modo de ligação com o todo. É uma parte fundamental da nossa herança, e, embora a ligação possa estar enfraquecida pela vida moderna, a capacidade de ligação e a inclinação para o fazer ainda estão presentes.
Este livro é uma introdução às práticas xamânicas e será um guia na direcção da sabedoria através de rituais, de viagens distantes e da interpretação de sonhos."

24/03/2010

Opinião pessoal: Homenagem a Leandro


Nos últimos dias têm sido abundantes as notícias nos espaços de informação sobre o fenómeno do bullying. Não porque seja um fenómeno recente, mas porque Leandro, um menino de 12 anos, vítima constante de violência física e psicológica, atirou-se ao rio Tua.
Ontem assisti com lágrimas nos olhos e um sentimento de revolta e raiva a mais uma reportagem sobre este tema na TV, não só pela incomensurável tragédia que é um menino de 12 anos sentir que não encontra outra alternativa senão acabar com a própria vida, sem esquecer as outras crianças que passam pelo mesmo, mas também porque tocar neste tema é acordar memórias dolorosas da minha própria infância.

Gostaria que todos se apercebessem que o bullying não é um fenómeno recente, nem exclusivo desta nova geração. Apenas este não era levado a sério por mais ninguém, a não ser por quem padecia deste mal. Foi necessário que uma criança desesperasse desta forma para este tema ser considerado com a relevância que sempre mereceu. Ainda estamos para ver que acções irão ser implementadas, que soluções...

Tenho 30 anos e fui vítima de bullying durante grande parte da minha infância e adolescência. Acredito que o facto de ser uma criança calma, sem instintos agressivos, seguidora da grande maioria das regras que nos impunham em casa e na escola e por fim uma boa aluna, fez automaticamente de mim um alvo.
Tenho ouvido discussões sobre este tema, variadíssimas opiniões e suas nuances. Choco imediatamente com quem me diz que as crianças agressoras não têm noção dos seus actos, do impacto das mesmas. Apercebo-me que queiram manter a infância um ideal imaculado, pensar nas crianças enquanto seres incapazes das mesmas sombras da idade adulta. Lamento, mas a realidade é distinta.

Uma criança sente inveja, frustação, rancor, ira, medo, ciúme, é egocêntrica tanto quanto os seus congéneres adultos. Somos tal e qual os animais selvagens no instinto de procurar a posição alfa na matilha e, enquanto crianças poucos de nós conseguem refrear esses ímpetos anímicos. E, muitos adultos ficam chocados quando se apercebem do como as crianças conseguem ser cruéis.
Falta à grande maioria das crianças a compreensão dos seus próprios sentimentos e o saber lidar com estes. Falta-lhes a disciplina para saberem que nunca devem seguir os sentimentos mais obscuros e como os afastar. Como se conhecerem, a si e à raiz dos seus pensamentos, sentimentos e acções. E, sim, falta serem disciplinadas e castigadas com severidade quando as suas acções são fonte de dor. A muitas ainda faltam bons exemplos em casa...

Aos adultos que lidam com crianças falta-lhes acima de tudo bom senso.
Lembro-me de um dia, creio que no 8º ano, me ter queixado finalmente a uma professora que um colega de turma, mais velho, logo maior e mais forte, me batia e me ameaçava constantemente. Acho que me chamou "mariquinhas", disse algo como "Oh Ana, tenha paciência!" e o assunto morreu ali. Olhou-me com desprezo, tratou-me de forma igual. Fez questão de me fazer sentir que não havia nada mais infantil do que nos queixarmos.
Foi a primeira e última vez que me queixei a alguém, de uma situação que me atormentava há anos, através de diversos agressores.
O comportamento desta professora era a regra, não a excepção.
Uma outra vez, defendi-me quando atacada por duas colegas de liceu e quando separadas pelas funcionárias, eu é que levei a reprimenda. Fica eternamente a boa memória de me ter comportado exemplarmente nas lambadas que distribui! Vivam os filmes de kung fu e o que aprendi neles! Olaré!

A solução que encontrei na altura foi fazer de tudo para encontrar forças interiormente, nunca mais mostrar fraqueza e quando agredida tentar dar tanto quanto levava. "Olho por olho, dente por dente".
Acredito que resultou.

Embora o meu liceu fosse razoavelmente calmo, um dia, como aluna mais velha que assumia o papel de proteger os mais novos e indefesos, confisquei a um miúdo de um bairro problemático, (que passava frequentemente por lá para assaltar miúdos que parecessem indefesos), uma navalha de ponta e mola.
No dia seguinte lá estava ele à minha espera, acompanhado de mais de uma dezena de rufiões. Aí tive a prova de como me tinha tornado forte. Pedi-lhe um momento e regressei com uma amiga, a única que encontrei naquela hora morta. Não houve violência. Não mostrei medo. Falei com autoridade e ameacei-o com a polícia. Ficou por ali.

Tenho 30 anos. Tenha a idade que tiver as marcas do bullying ficam connosco por toda a vida. Quanto mais velhos e sapientes ficamos, maior a consciência dos anos que perdemos a lamber as feridas, a sentir que não somos desejados, a tentar compreender o que há de errado connosco que justifique sermos maltratados, a tentar readquirir aptidões naturais como a autoestima, a sociabilização, a confiança... O esforço sobrehumano de lidar com a raiva, a frustação, a ira, a mágoa. A tarefa hercúlea que é não deixar que os sentimentos negativos que derivaram dos abusos suplantem o nosso verdadeiro ser, a pessoa boa, pura e luminosa que sabemos que somos e que não queremos que se extinga. Então somos pura dualidade, um vulcão que luta contra a vontade de entrar em erupção e de os queimar, a todos que nos magoaram, de forma brutal, ou a nós próprios.

A criança que fui entende perfeitamente o Leandro, revê-se nele especialmente quando os familiares o descreveram como meigo e boa pessoa. Assustadoramente também a minha história poderia ter terminado precocemente e de forma dramática se não tivesse descoberto uma maior força interior e motivação. Motivação que derivou em grande parte de novos amigos fora do liceu, mais velhos.
Entristece-me que ninguém intervenha nestes casos a tempo. Enfurece-me a preguiça dos professores e dos funcionários escolares em actuar, em preocuparem-se. Assusta-me a ideia de um dia ser mãe porque numa situação assim, alimentada pelos meus fantasmas do passado, sei que perderia a cabeça.

A ti, Leandro, que tenhas encontrado paz e repouso. A todos os outros, abram os olhos.

Arte que se vê: "Julie e Julia" de Nora Ephron



Julia Childs - pseudónimo de Julia Carolyn McWilliams - foi uma famosa autora de livros de culinária e apresentadora de televisão americana. Nasceu em 1912, faleceu em 2004. Trabalhou afincadamente e durante anos no seu primeiro livro - Mastering the Art of French Cooking - com o objectivo de tornar a cozinha francesa acessível às donas de casa americanas que não tinham o seu próprio chef. Conquistou o seu lugar em milhões de lares, no Smithsonian e o apreço de gerações de mulheres.

Julie Powell nasceu em 1973. Tinha um curso superior em Teatro e Escrita Criativa que não lhe tinha servido para mais do que meio romance escrito durante 8 anos, sem chamar a atenção de nenhuma editora e, um conjunto de trabalhos sem saída. Julie estava prestes a entrar nos trintas. O que tinha sido conseguido por si até agora parecia-lhe infinitamente pouco recompensador, especialmente quando comparações eram feitas no almoço semanal com as melhores amigas.
O escape para todo este stress era o prazer encontrado na cozinha, na degustação de bem elaborados petiscos ao jantar com o marido.

Foi por sugestão do seu marido que Julie Powell começou a escrever o seu blog. O que começou por ser um escape das frustações do dia-a-dia, passou a ser um desafio levado muito a sério: percorrer todas as mais de 500 receitas do livro de Julia, "Mastering the Art of French Cooking", num só ano. Em pouco tempo o blog intititulado "the Project Julie / Julia" tinha uma legião de leitores que seguiam atentamente os desaires desta jovem trintona. E Julie alheia desta realidade. Creio que apenas se apercebeu quando foi convidada a transformar este projecto num livro e, mais no filme que hoje vos falo.

O filme vai intercalando cenas da vida de Julia Childs, brilhantemente interpretada por Meryl Streep, na época em que vivia em Paris com o marido, quando começou a aprender a cozinhar e a trabalhar no seu primeiro livro, com cenas da vida de Julie, a sua história e o seu projecto.

Gostei francamente deste filme. Pela história, pelos desempenhos. Sobretudo porque foi muito fácil reconhecer-me em Julie, de tal forma que o meu marido riu-se imenso por nela me reconhecer igualmente.


Project Julie/ Julia: http://blogs.salon.com/0001399/2002/08/25.html



23/03/2010

Arte que se lê: "Cuidar dos nossos pais" de Roberta Satow, Phd



Descobri este livro por mero acaso quando passava numa grande loja de produtos electrónicos. Para quem gosta de livros é impossível não parar quando lemos um cartaz que diz "Livros a partir de 1 euro".
Este era o único exemplar e trouxe-o por somente 3 euros em conjunto com um manual sobre jardinagem.
Abri-o numa página ao acaso e pelo que li acreditei que este livro estava lá esquecido, pousado, à minha espera. Não por mim, mas pela minha mãe que recentemente passou pela situação de ter que encontrar, em conjunto com os irmãos, uma situação viável para os pais que chegaram a uma idade em que precisam de acompanhamento, de cuidados e, sobretudo de muita paciência.
Pude ver como observadora que ser cuidadora é tudo menos fácil. Naquele dia, na loja, não pude evitar de esboçar alguns sorrisos porque encontrei nas palavras da autora - reconhecida médica psiquiatra - muito do que eu própria dizia à minha mãe. Basicamente a mensagem que tentava transmitir à minha querida mãe e, que foi preciso repeti-la até à exaustão para que me ouvisse, foi que ela deveria estar sempre em primeiro lugar nas suas prioridades. Tudo o resto, todos os outros, incluíndo eu, o meu pai, os seus pais têm que aceitar com alegria um honroso segundo ou terceiro lugar.
A minha avó entretanto morreu, com uma bonita idade, já octogenária.
Em breve, quando acabar de ler este livro, vou oferecê-lo à minha mãe. Ele fala de amor, de culpa, dos fantasmas da infância que regressam quando os pais precisam de nós, da necessidade de estabelecer limites, da necessidade de dizer não, de cura, através da situação pessoal da autora com os seus pais, e de outras situações reais retratadas através de muitas outras pessoas.


Sinopse:

"Os profundos desafios emocionais que se apresentam a quem cuida de pais idosos numa relação ambivalente. Cuidar dos Nossos Pais ilustra a forma como as relações que tivemos com os nossos pais e irmãos na infância vêm mais tarde afectar a disposição com que enfrentamos a tarefa de cuidar dos pais.

Com tantos pais a viverem tanto tempo, a situação de tomar conta dos pais velhos quando estamos na meia-idade é coisa para se prolongar até à nossa própria velhice: há septuagenários a cuidarem dos pais com 90 e mais anos. A acrescentar a todas as dificuldades práticas que os cuidadores na meia-idade enfrentam, muitas vezes ainda têm que se confrontar com sentimentos da infância e da juventude que voltam a surgir neste novo contexto e que os deixam desconcertados. O passado interfere na vida de agora.
Muito se tem escrito sobre o envelhecimento e sobre o apoio prático aos cuidadores, mas este livro aborda uma nova perspectiva: encara a prestação de cuidados como uma fase de desenvolvimento em que surgem oportunidades para resolver questões pendentes, ainda incómodas, e para aprofundar e enriquecer a relação entre as gerações.
Roberta Satow mostra-nos como podemos identificar e superar padrões antigos - muitas vezes destrutivos - que continuam a afectar as relações adultas com os nossos pais envelhecidos. Ajuda-nos a compreender que é normal e aceitável sentirmos ambivalências no nosso novo papel - e demonstra como se podem definir limites, quando necessário, sem com isso sentirmos remorsos."
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