26/03/2010

Arte que se lê: "Xamanismo" de William Adcock


A vida é antes de mais uma enorme viagem de conhecimento. Para mim, a espiritualidade tem sido uma importante parte nessa viagem. Ao longo da minha existência tem sido grande a minha curiosidade e a minha fome de saber sobre as várias rotas que o Homem tem tomado para se ligar ao que é Superior, Intangível e Espiritual.
Quando me perguntam pela minha religião normalmente respondo "sem rótulos". Desde miúda que sempre acreditei que nenhum de nós precisa de intermediários para falar com Deus, para aceder a um estado mais elevado de consciência. Que, se Deus, se o Espírito Criador está em toda a parte, então era para mim natural que sentisse mais à vontade para estabelecer uma ligação ao comtemplar a natureza do que num edifício.

Fiz sempre questão de seguir o lema que nos ensina que todo o Homem é seu Mestre e Aprendiz e que é nesta perspectiva que devemos também encarar o próximo. Por isso, conforme o meu "apetite" vou-me dedicando ao estudo de várias matérias nesta área, edificando o meu conhecimento com aquilo que considero o "trigo" e despojando-me do "joio".
A minha grande e essencial regra é a de que, neste mundo de dualidade, de luz e sombra, eu aceito a minha sombra mas escolho em plena consciência a Luz e o que está de acordo com este registo.
Assim já fui colocando alguns frutos na minha cesta de campos como a Bíblia, o Alcorão, o Shantideva, o Tarot, o Reiki, a Meditação, Astrologia Kármica, Numerologia, Viagem Astral, Allan Kardec, Maçonaria, Hermetismo, Templarismo e Rosacruz, (etc), assim como com o que aprendo comigo e com todos os que me rodeiam. Não me tornei Mestre de nada, mas decerto um melhor Aprendiz.

Na sociedade de hoje acredito que são cada vez mais as pessoas que fazem a sua busca individual pela Espiritualidade, procurando algo com que se sintam em sintonia. Por ser uma busca individual, os caminhos por mim tomados irão sempre diferir num ponto ou outro de todos os outros "peregrinos". Um dos campos que intuitivamente fui visitar foi o do xamanismo.

Senti o xamanismo como algo natural e inato. Aqui o mundo dos sonhos tem uma relevância primordial que, de uma forma sem explicação, sempre conheci e sempre me disse muito. Desde criança que adoro dormir, que me era extremamente fácil voltar a um sonho, viajar no éter, sonhar a cores. Sempre tive a sensação de que trabalhava mais a dormir do que acordada, ainda tenho...

Igualmente, deste tenra idade sempre senti uma enorme empatia com os animais, uma facilidade em comunicar com estes, uma ligação com os que me são mais chegados. Sei que soa a coisa de gente doida, mas é algo tão simples como ouvir um cão ladrar, um gato miar e saber, na maioria das vezes exactamente o que querem dizer.

Sei que não existem coincidências, existem sim coisas que nos fazem pensar. Uma delas foi logo quando surgiu o meu interesse pelo xamanismo, (talvez um dia aqui relate essa minha aventura), passado muito pouco tempo uma senhora instalou o seu consultório no mesmo prédio onde moro. Não teria nada de notável não fosse ela uma xamã. Pareceu-me fantástico por meses antes nunca sequer ter ouvido falar do tema, nem sequer ter partilhado os meus pensamentos sobre tal.
Mesmo assim, não tão fantástico quanto outro episódio. O estudo do xamanismo levará qualquer um de nós, a seu tempo, a descobrir e a ser descoberto pelo seu animal de poder, a conhecê-lo e a criar unidade com o mesmo,(o nosso aliado espiritual que através da forma e das características desse determinado animal se adequa a cada um de nós, às nossas forças, fraquezas, lições que temos que aprender e missão de vida). Pois bem, certo dia na sessão de meditação em grupo, a nossa amiga que guiava as sessões sugeriu que a última hora fosse usada para enviarmos vibrações de amor e cura a cada uma nós, como numa roda de cura. Foi nesse dia que tive o primeiro vislumbre do poder, da beleza do papel do curandeiro e da utilidade do xamanismo e do animal de poder, mesmo nos dias de hoje, tão distantes das tribos uralo-altaicas da Sibéria onde se crê que o xamanismo surgiu há muitos milhares de anos. De olhos fechados, enquanto meditava, vi o meu animal dirigir-se primeiro a uma das participantes e depois a outra. Farejou ambas demoradamente, a uma lambeu-lhe o peito e a outra uma mão, olhando de seguida para mim. Após partilhar isto naquele dia com as minhas colegas, fiquei a saber que uma delas tinha cancro da mama naquele peito, e a outra tinha passado o dia com dores naquele pulso.

Deixo-vos um excerto do livro que hoje vos trago. É um livro pequeno, com bastantes ilustrações, uma boa base para quem tem curiosidade sobre este tema. Infelizmente até à data é o único livro que encontrei à venda em livrarias sobre xamanismo.

"O xamanismo é essencialmente um estado de espírito, um modo de ver a vida como um todo. O xamã adquire discernimento e sabedoria ao ligar-se a outras partes da Criação e restabelecendo as divisões existentes entre as diferentes partes. Essas divisões podem ocorrer em toda a parte: dentro do próprio eu, dentro dos grupos, entre as pessoas e o meio, e assim sucessivamente.
A palavra "xamã" deriva do dialecto tungue das tribos uralo-atalaicas da Sibéria. Os xamãs eram os sacerdotes-médicos das tribos, responsáveis pela celebração de cerimónias e rituais, tratando dos doentes e cuidando de todos os aspectos relacionados com o bem-estar das pessoas.
O xamanismo não reconhece idade, sexo, raça ou doutrinas religiosas e, por isso, está disponível para todos. Na verdade, muitas pessoas têm experiências xamânicas sem as intitularem como tal. Poderia mesmo dizer-se que algumas descobertas científicas foram impulsionadas por experiências xamânicas. Os seres humanos são uma parcela da Criação, e o xamanismo é o nosso modo de ligação com o todo. É uma parte fundamental da nossa herança, e, embora a ligação possa estar enfraquecida pela vida moderna, a capacidade de ligação e a inclinação para o fazer ainda estão presentes.
Este livro é uma introdução às práticas xamânicas e será um guia na direcção da sabedoria através de rituais, de viagens distantes e da interpretação de sonhos."

24/03/2010

Opinião pessoal: Homenagem a Leandro


Nos últimos dias têm sido abundantes as notícias nos espaços de informação sobre o fenómeno do bullying. Não porque seja um fenómeno recente, mas porque Leandro, um menino de 12 anos, vítima constante de violência física e psicológica, atirou-se ao rio Tua.
Ontem assisti com lágrimas nos olhos e um sentimento de revolta e raiva a mais uma reportagem sobre este tema na TV, não só pela incomensurável tragédia que é um menino de 12 anos sentir que não encontra outra alternativa senão acabar com a própria vida, sem esquecer as outras crianças que passam pelo mesmo, mas também porque tocar neste tema é acordar memórias dolorosas da minha própria infância.

Gostaria que todos se apercebessem que o bullying não é um fenómeno recente, nem exclusivo desta nova geração. Apenas este não era levado a sério por mais ninguém, a não ser por quem padecia deste mal. Foi necessário que uma criança desesperasse desta forma para este tema ser considerado com a relevância que sempre mereceu. Ainda estamos para ver que acções irão ser implementadas, que soluções...

Tenho 30 anos e fui vítima de bullying durante grande parte da minha infância e adolescência. Acredito que o facto de ser uma criança calma, sem instintos agressivos, seguidora da grande maioria das regras que nos impunham em casa e na escola e por fim uma boa aluna, fez automaticamente de mim um alvo.
Tenho ouvido discussões sobre este tema, variadíssimas opiniões e suas nuances. Choco imediatamente com quem me diz que as crianças agressoras não têm noção dos seus actos, do impacto das mesmas. Apercebo-me que queiram manter a infância um ideal imaculado, pensar nas crianças enquanto seres incapazes das mesmas sombras da idade adulta. Lamento, mas a realidade é distinta.

Uma criança sente inveja, frustação, rancor, ira, medo, ciúme, é egocêntrica tanto quanto os seus congéneres adultos. Somos tal e qual os animais selvagens no instinto de procurar a posição alfa na matilha e, enquanto crianças poucos de nós conseguem refrear esses ímpetos anímicos. E, muitos adultos ficam chocados quando se apercebem do como as crianças conseguem ser cruéis.
Falta à grande maioria das crianças a compreensão dos seus próprios sentimentos e o saber lidar com estes. Falta-lhes a disciplina para saberem que nunca devem seguir os sentimentos mais obscuros e como os afastar. Como se conhecerem, a si e à raiz dos seus pensamentos, sentimentos e acções. E, sim, falta serem disciplinadas e castigadas com severidade quando as suas acções são fonte de dor. A muitas ainda faltam bons exemplos em casa...

Aos adultos que lidam com crianças falta-lhes acima de tudo bom senso.
Lembro-me de um dia, creio que no 8º ano, me ter queixado finalmente a uma professora que um colega de turma, mais velho, logo maior e mais forte, me batia e me ameaçava constantemente. Acho que me chamou "mariquinhas", disse algo como "Oh Ana, tenha paciência!" e o assunto morreu ali. Olhou-me com desprezo, tratou-me de forma igual. Fez questão de me fazer sentir que não havia nada mais infantil do que nos queixarmos.
Foi a primeira e última vez que me queixei a alguém, de uma situação que me atormentava há anos, através de diversos agressores.
O comportamento desta professora era a regra, não a excepção.
Uma outra vez, defendi-me quando atacada por duas colegas de liceu e quando separadas pelas funcionárias, eu é que levei a reprimenda. Fica eternamente a boa memória de me ter comportado exemplarmente nas lambadas que distribui! Vivam os filmes de kung fu e o que aprendi neles! Olaré!

A solução que encontrei na altura foi fazer de tudo para encontrar forças interiormente, nunca mais mostrar fraqueza e quando agredida tentar dar tanto quanto levava. "Olho por olho, dente por dente".
Acredito que resultou.

Embora o meu liceu fosse razoavelmente calmo, um dia, como aluna mais velha que assumia o papel de proteger os mais novos e indefesos, confisquei a um miúdo de um bairro problemático, (que passava frequentemente por lá para assaltar miúdos que parecessem indefesos), uma navalha de ponta e mola.
No dia seguinte lá estava ele à minha espera, acompanhado de mais de uma dezena de rufiões. Aí tive a prova de como me tinha tornado forte. Pedi-lhe um momento e regressei com uma amiga, a única que encontrei naquela hora morta. Não houve violência. Não mostrei medo. Falei com autoridade e ameacei-o com a polícia. Ficou por ali.

Tenho 30 anos. Tenha a idade que tiver as marcas do bullying ficam connosco por toda a vida. Quanto mais velhos e sapientes ficamos, maior a consciência dos anos que perdemos a lamber as feridas, a sentir que não somos desejados, a tentar compreender o que há de errado connosco que justifique sermos maltratados, a tentar readquirir aptidões naturais como a autoestima, a sociabilização, a confiança... O esforço sobrehumano de lidar com a raiva, a frustação, a ira, a mágoa. A tarefa hercúlea que é não deixar que os sentimentos negativos que derivaram dos abusos suplantem o nosso verdadeiro ser, a pessoa boa, pura e luminosa que sabemos que somos e que não queremos que se extinga. Então somos pura dualidade, um vulcão que luta contra a vontade de entrar em erupção e de os queimar, a todos que nos magoaram, de forma brutal, ou a nós próprios.

A criança que fui entende perfeitamente o Leandro, revê-se nele especialmente quando os familiares o descreveram como meigo e boa pessoa. Assustadoramente também a minha história poderia ter terminado precocemente e de forma dramática se não tivesse descoberto uma maior força interior e motivação. Motivação que derivou em grande parte de novos amigos fora do liceu, mais velhos.
Entristece-me que ninguém intervenha nestes casos a tempo. Enfurece-me a preguiça dos professores e dos funcionários escolares em actuar, em preocuparem-se. Assusta-me a ideia de um dia ser mãe porque numa situação assim, alimentada pelos meus fantasmas do passado, sei que perderia a cabeça.

A ti, Leandro, que tenhas encontrado paz e repouso. A todos os outros, abram os olhos.

Arte que se vê: "Julie e Julia" de Nora Ephron



Julia Childs - pseudónimo de Julia Carolyn McWilliams - foi uma famosa autora de livros de culinária e apresentadora de televisão americana. Nasceu em 1912, faleceu em 2004. Trabalhou afincadamente e durante anos no seu primeiro livro - Mastering the Art of French Cooking - com o objectivo de tornar a cozinha francesa acessível às donas de casa americanas que não tinham o seu próprio chef. Conquistou o seu lugar em milhões de lares, no Smithsonian e o apreço de gerações de mulheres.

Julie Powell nasceu em 1973. Tinha um curso superior em Teatro e Escrita Criativa que não lhe tinha servido para mais do que meio romance escrito durante 8 anos, sem chamar a atenção de nenhuma editora e, um conjunto de trabalhos sem saída. Julie estava prestes a entrar nos trintas. O que tinha sido conseguido por si até agora parecia-lhe infinitamente pouco recompensador, especialmente quando comparações eram feitas no almoço semanal com as melhores amigas.
O escape para todo este stress era o prazer encontrado na cozinha, na degustação de bem elaborados petiscos ao jantar com o marido.

Foi por sugestão do seu marido que Julie Powell começou a escrever o seu blog. O que começou por ser um escape das frustações do dia-a-dia, passou a ser um desafio levado muito a sério: percorrer todas as mais de 500 receitas do livro de Julia, "Mastering the Art of French Cooking", num só ano. Em pouco tempo o blog intititulado "the Project Julie / Julia" tinha uma legião de leitores que seguiam atentamente os desaires desta jovem trintona. E Julie alheia desta realidade. Creio que apenas se apercebeu quando foi convidada a transformar este projecto num livro e, mais no filme que hoje vos falo.

O filme vai intercalando cenas da vida de Julia Childs, brilhantemente interpretada por Meryl Streep, na época em que vivia em Paris com o marido, quando começou a aprender a cozinhar e a trabalhar no seu primeiro livro, com cenas da vida de Julie, a sua história e o seu projecto.

Gostei francamente deste filme. Pela história, pelos desempenhos. Sobretudo porque foi muito fácil reconhecer-me em Julie, de tal forma que o meu marido riu-se imenso por nela me reconhecer igualmente.


Project Julie/ Julia: http://blogs.salon.com/0001399/2002/08/25.html



23/03/2010

Arte que se lê: "Cuidar dos nossos pais" de Roberta Satow, Phd



Descobri este livro por mero acaso quando passava numa grande loja de produtos electrónicos. Para quem gosta de livros é impossível não parar quando lemos um cartaz que diz "Livros a partir de 1 euro".
Este era o único exemplar e trouxe-o por somente 3 euros em conjunto com um manual sobre jardinagem.
Abri-o numa página ao acaso e pelo que li acreditei que este livro estava lá esquecido, pousado, à minha espera. Não por mim, mas pela minha mãe que recentemente passou pela situação de ter que encontrar, em conjunto com os irmãos, uma situação viável para os pais que chegaram a uma idade em que precisam de acompanhamento, de cuidados e, sobretudo de muita paciência.
Pude ver como observadora que ser cuidadora é tudo menos fácil. Naquele dia, na loja, não pude evitar de esboçar alguns sorrisos porque encontrei nas palavras da autora - reconhecida médica psiquiatra - muito do que eu própria dizia à minha mãe. Basicamente a mensagem que tentava transmitir à minha querida mãe e, que foi preciso repeti-la até à exaustão para que me ouvisse, foi que ela deveria estar sempre em primeiro lugar nas suas prioridades. Tudo o resto, todos os outros, incluíndo eu, o meu pai, os seus pais têm que aceitar com alegria um honroso segundo ou terceiro lugar.
A minha avó entretanto morreu, com uma bonita idade, já octogenária.
Em breve, quando acabar de ler este livro, vou oferecê-lo à minha mãe. Ele fala de amor, de culpa, dos fantasmas da infância que regressam quando os pais precisam de nós, da necessidade de estabelecer limites, da necessidade de dizer não, de cura, através da situação pessoal da autora com os seus pais, e de outras situações reais retratadas através de muitas outras pessoas.


Sinopse:

"Os profundos desafios emocionais que se apresentam a quem cuida de pais idosos numa relação ambivalente. Cuidar dos Nossos Pais ilustra a forma como as relações que tivemos com os nossos pais e irmãos na infância vêm mais tarde afectar a disposição com que enfrentamos a tarefa de cuidar dos pais.

Com tantos pais a viverem tanto tempo, a situação de tomar conta dos pais velhos quando estamos na meia-idade é coisa para se prolongar até à nossa própria velhice: há septuagenários a cuidarem dos pais com 90 e mais anos. A acrescentar a todas as dificuldades práticas que os cuidadores na meia-idade enfrentam, muitas vezes ainda têm que se confrontar com sentimentos da infância e da juventude que voltam a surgir neste novo contexto e que os deixam desconcertados. O passado interfere na vida de agora.
Muito se tem escrito sobre o envelhecimento e sobre o apoio prático aos cuidadores, mas este livro aborda uma nova perspectiva: encara a prestação de cuidados como uma fase de desenvolvimento em que surgem oportunidades para resolver questões pendentes, ainda incómodas, e para aprofundar e enriquecer a relação entre as gerações.
Roberta Satow mostra-nos como podemos identificar e superar padrões antigos - muitas vezes destrutivos - que continuam a afectar as relações adultas com os nossos pais envelhecidos. Ajuda-nos a compreender que é normal e aceitável sentirmos ambivalências no nosso novo papel - e demonstra como se podem definir limites, quando necessário, sem com isso sentirmos remorsos."
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