30/07/2010

Crónica da Carica: O que é um bom restaurante?


Como todas as pessoas, fui desenvolvendo, ao longo da vida, a minha própria relação com a comida. Gosto de aprender sobre os alimentos, a sua confecção e sobretudo, apreciar as refeições, no que toca igualmente a sabor, companhia e ambiente. Este é simplesmente um reflexo da vida adulta. Quando o tempo livre escasseia, estes momentos ganham uma nova dimensão e um valor redobrado.
O mais engraçado é que quanto maior é o meu gosto e interesse em redor das questões gastronómicas, mais restaurantes entram na minha "lista negra".
Na minha opinião, um restaurante que apenas sirva comida não cumpre o seu papel na totalidade. Um restaurante tem o dever de servir boa comida. Sinto-me frustada quando pago para comer algo que tenho a certeza que eu faria melhor na minha cozinha, a uma fracção do preço.

Mas, afinal de contas, o que é um bom restaurante?
Quando penso nisto algumas variáveis saltam à vista, como a comida, o preço, o atendimento, o ambiente.
Acima de tudo sou uma pessoa simples. Facilmente prefiro um restaurante pouco requintado, onde nos sintamos bem acolhidos, do que um local demasiado faustoso. As melhores memórias gastronómicas que guardo vivi-as em restaurantes menos sofisticados. Algumas retenho-as desde a minha infância, como o maravilhoso cozido de grão que comia em Canal Caveira, com os meus pais, a caminho da casa dos meus avós. Ou nas idas tão frequentes, também com os meus pais, ao antigo restaurante "o Lagar", na zona saloia, onde nos esperava um saboroso cabrito à lagar.

Sou simples, mas sou exigente. Na minha perspectiva é justo esperar, ao entrar num restaurante, que a comida seja bem confeccionada, com ingredientes de qualidade e saborosa. Que o preço seja justo. Que os empregados tenham boa apresentação e saibam atender com simpatia, profissionalismo e eficiência. Que, independentemente da decoração, de mais ou menos requinte, a higiene seja levada muito a sério, inclusivé nas casas de banho. Que no caso de haver música ambiente, esta não esteja tão alta que impeça a conversação à mesa, porque ninguém se ouve. Que o espaço entre as mesas não seja tão parco, que se alguém tiver que passar no meio significa quase encostar a bunda na cara de quem está sentado.

A gastronomia é uma das expressões da cultura de qualquer país, tão válida quanto qualquer outro tipo de arte.
Se pareço exigente quanto ao que espero de um restaurante, é porque toda a vida estive cercada por bons exemplos. Para além de um tio chef, também os meus pais trabalharam no ramo da hotelaria toda a vida, colaborando em hóteis de renome. Também eu trabalhei durante alguns Verões com eles e pude aplicar aquilo que só conhecia em teoria, dos muitos manuais que encontrava lá por casa.
Enquanto empregada de mesa de um hotel de quatro estrelas, sempre tive a consciência de me apresentar com a postura que se espera de um profissional do sector, mesmo que fosse apenas uma ocupação temporária de Verão. Não tinha mais de 18/19 anos na altura, mas assumia a responsabilidade de dar ao cliente o melhor atendimento que eu poderia providenciar, com simpatia, farda sempre impecável acompanhada de um sorriso e bons modos.
Mesmo quando desempenhei esse papel numa conhecida pizzaria, continuei com a mesma postura com que servia num hotel 4 estrelas, o que era altamente apreciado pelos clientes e pela gerência. Com os meus pais como exemplo, nem poderia ser de outra forma.

A partir dessa altura foi-me muito fácil perceber o meu pai, porque motivo ele se irritava facilmente quando íamos a um restaurante, bar ou café e éramos atendidos, por quem, claramente não tinha a menor vocação nem formação para trabalhar em restauração.
Infelizmente é o que existe de mais comum por aí: estabelecimentos abertos por quem não percebe nada do que é bem servir, de como estabelecer uma boa casa. Existem honrosas excepções de pessoas que, embora não tenham a formação, têm a vocação, o gosto, sobressaem pela forma como recebem e não os imaginamos em mais lado nenhum.

Depois existem os maus casos, tão frequentes, os que vou colocando na tal "lista negra". Aqueles em que não deixamos gorjeta como protesto silencioso, para os quais esboçamos um sorriso amarelo à saída, enquanto juramos solenemente em silêncio nunca mais voltar. Aqueles que para mim são inferiores a uma bela falafel ou até um hamburger comidos no shopping.

Cá em casa estamos a caminho da cura para as más experiências gastronómicas. Um dos passos foi a jura solene de recusar todos os convites para jantares de grupo, mais especificamente aqueles jantares de aniversário com ementas pré-definidas, onde nos servem os mais que dejá vú bacalhau com natas e bifinhos com cogumelos.
O ano passado, depois de uma má experiência na praia de Carcavelos, chegámos à conclusão que já não temos, nem idade nem pachorra, para dividir doses microscópicas de comida sensaborona com uma mesa repleta de estranhos, com quem estamos colados pelos cotovelos, sem conversa possível por falta de assunto e porque o tipo do karaoke gosta demais de ouvir a própria voz. E ainda pagar uma nota pela experiência dolorosa.

Sem comentários:

Google