28/07/2010

Arte que se lê: "Caim" de José Saramago



Hoje falo de Saramago. Também este espaço deve uma referência ao que é o Prémio Nobel da Literatura de 1998. Digo "o que é" ao invés de "o que foi", porque no caso das artes, somente o homem morre. Como todos os outros, desmaterializa-se até fazer parte da própria terra. Mas, enquanto houver gente, há memória, logo a obra fica, passa de mãos, voa por aí largando sementes.
Comecei a ler Saramago apenas há poucos anos. Confesso que me faltava a motivação para começar. Pensei que me assustaria, ou que me faltaria a paciência, com a forma de expressão pouco ortodoxa, nada formal, pela qual Saramago era conhecido. Mas acabou por ser essa sofreguidão que me fez render, essa sensação de um livro que parece apresentar-se sem espaço para inspirações nem expirações, de um só fôlego.

Escolho "Caim" sem qualquer despeito pela sua restante obra. Simplesmente porque foi um dos livros que trouxe de uma Feira do Livro este passado fim de semana.

Um excerto:

" A sua primeira morada foi uma estreita caverna, em verdade mais cavidade que caverna, de tecto baixo, descoberta num afloramento rochoso ao norte do jardim do éden quando, desesperados, vagueavam à procura de um abrigo. Ali puderam finalmente, defender-se da queimação brutal de um sol que em nada se parecia com aquela invariável benignidade de temperatura a que estavam habituados, constante de noite e de dia, e em qualquer época do ano. Abandonaram as grossas peles que os sufocavam de calor e mau cheiro, e regressaram à primeira nudez, mas, para proteger de agressões as partes delicadas do corpo, as que andam só mais ou menos resguardadas entre as pernas, inventaram, utilizando peles mais finas e de pêlo mais curto, aquilo a que mais tarde virá a chamar-se de saia, idêntica na forma tanto para as mulheres como para os homens. Nos primeiros dias, sem terem ao menos uma côdea para mastigar, passaram fome. O jardim do éden era ubérrimo em frutos, aliás não se encontrava lá outra coisa de proveito, até aqueles animais que, por natureza, deveriam alimentar-se de carne sangrenta, pois para carnívoros vieram ao mundo, haviam sido, por imposição divinam submetidos à mesma melancólica e insatisfatória dieta. O que não se sabia era donde tinham vindo as peles que o senhor fizera aparecer com um simples estalar de dedos, como um prestidigitador. De animais eram, e grandes, mas vá lá saber-se quem os teria matado e esfolado, e onde."´

http://www.josesaramago.org/

1 comentário:

Meus Netos...Minha Fortuna!!! disse...

Querida amiga
Como vou partir para "férias" com os netinhos, para a minha aldeia Natal, como de costume, não o quis fazer sem aqui vir deixar um grande beijinho com muita amizade e muito carinho e dizer que todas estão no meu coração!
Até Setembro, se Deus quizer amiga!
Felicidades, saúde e muita alegria!
Um grande e terno beijinho com a amizade de sempre
Vóvó Cassilda

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